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Maristela Palmeira de Barros Souza

POLICITAÇÃO EM CONTRATOS INTERNACIONAIS DE COMPRA E VENDA MERCANTIL

Atualizado: 24 de jun.

BIDDING IN INTERNATIONAL CONTRACTS FOR THE SALE OF GOODS


 

Informações Básicas

  • Revista Qualyacademics

  • ISSN: 2965-9760

  • Tipo de Licença: Creative Commons, com atribuição e direitos não comerciais (BY, NC).

  • Recebido em: 31/05/2024

  • Aceito em: 06/06/2024

  • Revisado em: 17/06/2024

  • Processado em: 19/06/2024

  • Publicado em 23/06/2024

  • Categoria: Estudo de Revisão


 




Como referenciar esse artigo Souza (2024):


SOUZA, Maristela Palmeira de Barros. Policitação em contratos internacionais de compra e venda mercantil. Revista QUALYACADEMICS. Editora UNISV; v. 2, n. 3, 2024; p. 302-325. ISSN: 2965-9760 | DOI: doi.org/10.59283/unisv.v2n3.021



Autora:


Maristela Palmeira de Barros Souza

Advogada, pós-graduada, pela: Escola de Magistrados da Bahia – EMAB – Universidade Federal da Bahia – UFBA, Pós em Direito e Magistratura. Pós-Graduada, pela: Universidade Salvador – UNIFACS – Especialização em Direito Contratual Cível e Consumerista. Graduada em Direito, pela Universidade Católica do Salvador – UCSAL. Contato: maristelabarros.juridico@gmail.com.





RESUMO


Este estudo tem como objetivo investigar a possibilidade de existência de elementos contraditórios na formação de contratos, especialmente no que se refere à vinculação da policitação, em contratos internacionais de compra e venda mercantil. Utilizando uma metodologia de análise comparativa entre a legislação interna, especificamente o Código Civil Brasileiro, e a Convenção das Nações Unidas sobre Contratos de Compra e Venda Internacional de Mercadorias (CISG), o trabalho justifica-se pela necessidade de determinar qual norma deve prevalecer em caso de conflitos, visando à melhor adequação aos reclames do comércio exterior. A análise detalhada das negociações preliminares e das manifestações de vontade revela que, diante de tais conflitos, deve-se priorizar a norma internacional, a CISG, por sua capacidade de unificar critérios e promover maior consenso entre as partes envolvidas, ao mesmo tempo em que impulsiona a movimentação do mercado global. Os principais resultados indicam a proeminência da norma universal como ferramenta crucial para garantir segurança jurídica e eficiência nas transações comerciais internacionais, eliminando a influência de disposições particulares e facilitando o desenvolvimento do comércio global.

 

Palavras-chave: Contratos Internacionais; Código Civil Brasileiro; Arbitragem e Convenção de Viena.

 

ABSTRACT

 

This study aims to investigate the possibility of contradictory elements in the formation of contracts, particularly concerning the binding nature of bidding, in international contracts for the sale of goods. Using a comparative analysis methodology between domestic legislation, specifically the Brazilian Civil Code, and the United Nations Convention on Contracts for the International Sale of Goods (CISG), the work is justified by the need to determine which regulation should prevail in the event of conflicts, seeking the best adaptation to the demands of international trade. Detailed analysis of preliminary negotiations and declarations of intent reveals that, in such conflicts, the international regulation, the CISG, should be prioritized due to its capacity to unify criteria and promote greater consensus among the parties involved, while simultaneously boosting the movement of the global market. The main results indicate the prominence of the universal regulation as a crucial tool to ensure legal certainty and efficiency in international commercial transactions, eliminating the influence of provisions and facilitating the development of global trade.

 

Keywords: International Contracts; Brazilian Civil Code; Arbitration and Vienna Convention.

 

1. INTRODUÇÃO

 

Ao interagir com o meio social, o homem pode manifestar tanto interesses convergentes quanto divergentes. Seu próprio instinto o conduz à interação social necessária para sua existência, fazendo-o cooperar ou, por vezes, entrar em conflito. O Direito, por sua vez, é estabelecido como última ratio, ou última instância, uma barreira criada pela sociedade para regrá-la, submetendo as oportunidades aos ditames consistentes com o objetivo de alcançar a pacificação social. Nesse contexto, o Direito se configura como um mecanismo destinado à coletividade, responsável por organizar interesses contrapostos.


Historicamente, a justiça era feita por autotutela ou pelas próprias mãos privadas, sendo posteriormente substituída pela atuação do Poder Público. Contudo, remanescem ainda algumas previsões desse instituto, como a legítima defesa e o estado de necessidade, conforme previsto no Código Penal Brasileiro. Atualmente, a aplicação do Direito está sob domínio estatal. Entretanto, a Justiça pública não consegue deliberar sobre todos os conflitos de maneira satisfatória e em tempo hábil, evitando o perecimento do direito e mantendo a paz social. As lides sociais surgem em maior escala do que a Justiça pode efetivamente resolver, o que torna a arbitragem um meio alternativo eficaz para solucionar controvérsias.


Este artigo pretende abordar o significado e a relevância dos contratos de compra e venda, especialmente no contexto mercantil e internacional. Aborda-se a arbitragem como um meio adequado para a resolução de conflitos decorrentes desses contratos, analisando sua natureza jurídica e conceito. Busca-se compreender, em casos de dispositivos contraditórios relacionados à vinculação da policitação, qual norma deve prevalecer: a interna, representada pelo Código Civil Brasileiro (CCB/2002), ou a externa, representada pela Convenção Internacional de Compra e Venda de Mercadorias (CISG), também conhecida como Convenção de Viena.


A problemática é conduzida com base nos seguintes questionamentos: a) Quais são os regramentos norteadores da policitação no Brasil? b) Por que a arbitragem seria o método mais adequado para a resolução de conflitos internacionais? c) Existem normas internacionais que tratam da compra e venda de mercadorias? d) Caso positivo, essas normas têm o poder de vincular os contratantes às ofertas em detrimento da norma interna (CCB)?


O objetivo geral é analisar a espécie contratual de compra e venda, focando na compra e venda internacional de mercadorias e na arbitragem como forma alternativa de resolução de conflitos. O objetivo específico é elucidar a problemática da aplicação de dispositivos nacionais ou supranacionais na vinculação da proposta nos contratos internacionais de compra e venda mercantil. Por fim, será destacada a importância e finalidade do estudo, concluindo-se a análise sem a pretensão de esgotar o tema.

 

2. CONTRATO DE COMPRA E VENDA

 

Ao longo do tempo, as relações contratuais tornaram-se mais complexas, acarretando maior regramento por parte do Estado. A celebração contratual acomoda, hoje, a segurança jurídica encontrada no princípio da força obrigatória dos contratos, utilizado desde tempos remotos, atrelada ao princípio da autonomia privada, que permite celebrações não defesas ou devidamente autorizadas em lei.

 

2.1. CONCEITO

 

A liberdade de contratar é produto dos anseios sociais apresentados em determinado momento. As necessidades sociais, portanto, "têm o poder tanto para mitigar quanto para impulsionar o livre-arbítrio dos contratantes", demonstrando, assim, o constante duelo entre as vontades dos indivíduos e do grupo social (Cogliolo, 1915 apud Neto; Ferreira, 2015).


Corroborando com o entendimento acima exposto, Oliveira e Silva (2015) afirmam que


os contratos são instrumentos jurídicos particulares confeccionados pelos sujeitos de direito civil, com a finalidade de celebrar negócio jurídico. Foram criados pelas pessoas desde que o homem passou a viver em sociedade visando a criar dispositivos que ditariam as regras a regerem o comportamento dos mais variados grupos sociais.

 

Por outro lado, a liberdade de contratar ou autonomia privada, inerente aos ajustes, é restringida em razão do objetivo social do pacto e da boa-fé objetiva. O Código Civil Brasileiro (CCB) de 2002 estabelece no Art. 421 que "a liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato" e no Art. 422 que "os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé."


Tal liberdade se relaciona com o tipo contratual e o conteúdo aventado, de acordo com a ordem jurídica. A função social referida remete-se aos efeitos emanados do contrato, obrigando as partes a se adequarem às perscrutações da sociedade, de modo a não a prejudicar, servindo, desse modo, como entrave ao arbítrio. Nesse sentido, Dantas (2014) marca que o direito civil é apontado como "direito civil constitucionalizado", à medida que apresenta normas, anteriormente consideradas individualistas, amoldadas agora à Carta Magna ou Constituição Cidadã da República Federativa do Brasil de 1988. O artigo 421 do CC/2002, compatibiliza os ancestrais princípios aplicados aos contratos com os coevos: boa-fé, equilíbrio contratual e função social dos contratos.


Entende-se que o contrato corresponde a um ajuste de vontades livremente manifestadas, "que faz lei entre as partes firmando direitos e obrigações" (Oliveira; Silva, 2015). Venosa (2013, p. 5), ao se dedicar ao contrato de compra e venda, ensina que este corresponde ao mais importante dentre todas as espécies contratuais, em virtude da sua comumente utilização.


A compra e venda, bem como a locação e a doação, inserem-se no grupo dos contratos que objetivam a transferência de um bem de um contratante a outro. Portanto, por sua importância econômica, a compra e venda é o contrato mais importante e mais frequente. Em razão disso, trata-se do contrato mais minuciosamente regulado pela lei.


No entendimento do legislador brasileiro, o artigo 481 do Código Civil de 2002 define que o contrato de compra e venda se traduz na transferência da posse ou propriedade do objeto contratual, mediante pagamento do preço previamente avençado: "Art. 481. Pelo contrato de compra e venda, um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe certo preço em dinheiro". Gonçalves (2014, p. 144) defende que o artigo 481 do Código Civil Brasileiro aponta somente o "caráter obrigacional do aludido contrato" de maneira recíproca. A transferência do domínio, no entanto, depende de outro ato: "a tradição, para os móveis (CC, arts. 1.226 e 1.267); e o registro, para os imóveis (arts. 1.227 e 1.245)" (Gonçalves, 2014, p. 144).

 

2.2. CLASSIFICAÇÃO E ELEMENTOS CONSTITUTIVOS

 

No que tange à classificação, conforme o conhecimento de Lôbo (2014, p. 206), o contrato de compra e venda se categoriza como bilateral, oneroso e consensual:


A compra e venda é contrato bilateral, oneroso e consensual, mediante o qual o vendedor assume a obrigação de transferir o bem ou coisa alienável e de valor econômico ao comprador, que por sua vez assume a obrigação de pagar o preço determinado ou determinável em dinheiro. A coisa pode ser corpórea ou incorpórea. É o mais importante dos contratos típicos e o mais utilizado pelas pessoas em seu cotidiano.

 

No dizer de Venosa (2013, p. 10), a estrutura contratual é acrescida da translatividade e comutatividade: "A compra e venda é um contrato oneroso, translativo, bilateral ou sinalagmático (de prestações correspectivas) e geralmente comutativo."


Assim, segundo o autor, a onerosidade é justamente a correspondência das prestações, com fito na vantagem econômica. A translatividade se refere à transferência da propriedade. O contrato é bilateral porque as partes se comprometem em direitos e obrigações mútuos. É comutativo quando o conteúdo da prestação é manifesto (Venosa, 2013, p. 10). Acrescenta que a compra e venda poderá dar-se, ainda, aleatoriamente, "quando da existência de desconhecimento preliminar da prestação" ou ser de "execução simultânea ou diferida, dependendo da vontade das partes" (Venosa, 2013, p. 11).


Lôbo (2014, p. 207) acentua que o contrato detém elementos considerados imprescindíveis à perfeita consonância da sua existência, como a coisa, o preço e o consentimento:


Os elementos essenciais que têm atravessado as vicissitudes históricas, são: a coisa, o preço e o consentimento. Ainda que a coisa seja futura ou aleatória, ou que o preço esteja dependente de determinadas circunstâncias, devem ser determináveis, previstas e objeto de consentimento de ambos os contratantes. Se faltar qualquer um desses elementos, a compra e venda não pode subsistir.

 

Coadunando com o entendimento acima colocado, Venosa (2013, p. 12), denomina tais elementos de: res (coisa), pretius (preço) e consensus (consentimento). A res ou coisa é o objeto apreciável economicamente, cuja propriedade pode ser transferida. Logo, "as coisas que estão fora do comércio, inalienáveis, portanto, não podem ser objeto de compra e venda" (Venosa, 2013, p. 13). O pretius ou preço é elemento primordial, pois que, sem a devida estipulação do valor, inexistirá compra e venda (Venosa, 2013, p. 15). O consentimento marca a essencialidade do contrato (Venosa, 2013, p. 18).

 

3. COMPRA E VENDA MERCANTIL

 

A compra e venda mercantil é a mesma espécie contratual supramencionada, voltada, agora, aos atos de comércio, visando ao lucro, precipuamente. Para FARIAS, ROSENVALD, (2014, p. 288):


Os contratos interempresarias são aqueles celebrados entre empresas, em que somente empresas fazem parte dessa relação, pois ambos os pólos dessa relação têm sua atividade movida pela busca do lucro.

 

Com base na movimentação de mercadorias, perquirem as empresas fazer circular o seu capital, tornando-as frutíferas, no ambiente mercadológico.


Diniz (1993, v. 1, p. 337 apud VENOSA, 2013, p. 11) aduz que a comercialidade do contrato se analisa a partir da existência de três itens: a) comerciante no exercício da profissão; b) coisa proveniente da atividade empresarial; c) intenção de revenda ou aluguel do objeto do contrato.


Tal raciocínio revela que, enquanto a compra e venda comum objetiva regramento das relações civis ou consumeristas, a compra e venda de mercadorias, por outro lado, possui um “ato especulativo, com intuito de lucro” (VENOSA, 2013, p. 12).


Resume-se, que os “contratos mercantis de compra e venda reger-se-ão pelas regras do CC/02 (art. 481 ss.) e pela legislação especial” (TEIXEIRA, 2010), frisando-se, no entanto, que tal legislação abarca tanto as empresariais quanto a consumerista.

 

4. CONTRATO INTERNACIONAL DE COMPRA E VENDA DE MERCADORIAS

 

Cabe salientar, segundo Diniz (2013, p. 691), que os contratos internacionais são elaborados sob diferentes tipos de negociações, compreendendo, assim os seguintes:


a)         Os realizados por particulares (pessoas naturais ou jurídicas, inclusive pelo Estado-comerciante, equiparado a um particular em suas negociações mercantis, que elegem a lei que irá regê-los, situando-se, portanto, na seara da autonomia da vontade.
b)         Os efetivados entre um Estado e particulares estrangeiros.
c)         Os firmados entre Estados, nos quais aparecem conexões e diferentes ordens jurídicas.

Há de se ressaltar, também, a estimação dessa especificidade por envolver relações globais, as quais fomentam a distribuição de riquezas, a partir do giro do comércio, seja por intermédio de pessoas públicas ou privadas. Adverte Venosa (2013, p. 53), que:


Se é o contrato de compra e venda o catalisador em geral, evidente que também se trata do negócio preponderante no comércio internacional, envolvendo pessoas naturais ou jurídicas, privadas ou públicas, de diferentes nacionalidades

 

Os contratos internacionais possuem características peculiares, devido aos riscos e oportunidades, sofrendo, por esse motivo, maiores influências de usos e costumes. Isso significa dizer que nem sempre a legislação interna se amoldará aos fatos, para dirimi-los.


Ilação essa, presenciada nas palavras de Bastos e Kiss (1990, apud VENOSA, 2013, p. 53-54):


Desse modo, deve ser compreendida a compra e venda internacional como aquela na qual mais de uma ordem jurídica, mais de um ordenamento nacional ou mais de um sistema jurídico surgem aptos para disciplinar o contrato.

 

Para Farias e Rosenvald (2014, p. 288) tais contratos, são “categorias unitárias e autônomas”, possuindo aspectos básicos, como:


a)   escopo de lucro – a economia final dos comportamentos é a principal característica dos negócios mercantis (...); b) função econômica como norte do contrato – as partes não contratam pelo mero prazer de trocar declarações de vontade (...), mas, objetivamente, para circular bens e serviços (...); c) custos de transação – a empresa contrata porque entende que o negócio trar- lhe-á mais vantagens do que desvantagens (...); d) egoísmo do agente econômico – a empresa perseguirá antes o seu próprio interesse do que aquele do parceiro comercial (...). (Sem grifos no original)

 

Outrossim, a lição de Ireneu Strenger (apud MAY, 2015, p. 628-649) abaliza o caráter desenvolvedor ínsito aos contratos internacionais:


As normas do Direito obrigacional são, inevitavelmente, aplicáveis às relações jurídicas emergentes da atividade mercantil, com algumas modificações. Tais modificações justificam-se pela necessidade de adaptar a ordem jurídica positiva à especialidade técnica da atividade econômico-mercantil. Esse é um aspecto confluente do Direito do Comércio Internacional e Interno, porquanto ambos têm por objeto a sistematização de técnicas jurídicas adequadas às operações de transformação e de circulação de bens ou de serviços no mercado.

 

O artigo 5º, inciso XXXV, da Carta Magna, preceitua: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito” (BRASIL, 1988). Sob esse aspecto, observa-se que o acesso à justiça é um direito de todos, isto é, garantido tanto aos brasileiros, em sua acepção mais ampla possível, quanto aos estrangeiros, residentes ou não no País.


Segundo Martins (2011), desde os tempos remotos, entenderam os homens a necessidade de se transferir a resolução de suas desavenças a outrem, para que decidisse a questão. Ainda nos tempos contemporâneos ocorre a mesma preocupação com a eficiência da resolução de demandas. Os métodos alternativos de pacificação social são tidos por mais céleres, coadunando com as exigências sociais. A intenção de se amoldar aos ultimatos do meio grupal é patentemente intuída no trecho extraído da Resolução de n.º 125, artigo 1º, parágrafo único, do Conselho Nacional de Justiça – CNJ - (BRASIL, 2010):


Art. 1º Fica instituída a Política Judiciária Nacional de tratamento dos conflitos de interesses, tendente a assegurar a todos o direito à solução dos conflitos por meios adequados à sua natureza e peculiaridade. (Redação dada pela Emenda nº 1, de 31.01.13) Parágrafo único. Aos órgãos judiciários incumbe oferecer mecanismos de soluções de controvérsias, em especial os chamados meios consensuais, como a mediação e a conciliação bem assim prestar atendimento e orientação ao cidadão.

 

O conciliador, segundo a Lei 13.105, de 17/03/2015, artigo 165, § 2º (BRASIL, 2015), é um elemento secundário, servindo, apenas, para auxiliar as partes, em sua composição:


Art. 165. Os tribunais criarão centros judiciários de solução consensual de conflitos, responsáveis pela realização de sessões e audiências de conciliação e mediação e pelo desenvolvimento de programas destinados a auxiliar, orientar e estimular a autocomposição. (...)
§ 2º O conciliador, que atuará preferencialmente nos casos em que não houver vínculo anterior entre as partes, poderá sugerir soluções para o litígio, sendo vedada a utilização de qualquer tipo de constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem.

 

O parágrafo terceiro do artigo 165 preleciona que o mediador tem um papel fundamental na compreensão real da lide (BRASIL, 2015):


§ 3o O mediador, que atuará preferencialmente nos casos em que houver vínculo anterior entre as partes, auxiliará aos interessados a compreender as questões e os interesses em conflito, de modo que eles possam, pelo restabelecimento da comunicação, identificar, por si próprios, soluções consensuais que gerem benefícios mútuos.

 

Sendo assim, o método conciliativo tem por escopo a busca do ajuste das vontades das partes envolvidas e, até então, desconhecidas. Por outro viés, a mediação, por conter um terceiro sem poder decisório, reveste-se da possibilidade de se ofertar uma melhor coexistência aos envolvidos, haja vista conhecidos, parentes ou vizinhos.

 

5. ARBITRAGEM

 

5.1 A NATUREZA JURÍDICA DA ARBITRAGEM

 

A arbitragem, no dizer de BERALDO (2014, p. 2-3) é um processo, de natureza híbrida, cujo nascedouro se dá no pacto privado. Veja-se:


Pode-se conceituar a arbitragem como sendo um processo no qual as partes, por meio de pacto privado, delegam a um árbitro, que nem mesmo precisa ser bacharel em Direito, bastando apenas que seja pessoa capaz, o poder de decidir a lide, dentro dos limites estabelecidos previamente na convenção, desde que verse sobre direitos disponíveis, sem a intervenção do Poder Judiciário, produzindo sentença arbitral, os mesmos efeitos da sentença judicial. A decisão tem, portanto, autoridade de coisa julgada e é passível de execução, nos termos do artigo 475 – N, do Código de Processo Civil (CPC).

 

O artigo 475 – N, do Código de Processo Civil (BRASIL, 1973), prevê:


Art. 475-N. São títulos executivos judiciais: (Incluído pela Lei nº 11.232, de 2005)
I       – a sentença proferida no processo civil que reconheça a existência de obrigação de fazer, não fazer, entregar coisa ou pagar quantia; (Incluído pela Lei nº 11.232, de 2005)
II     – a sentença penal condenatória transitada em julgado; (Incluído pela Lei nº 11.232, de 2005).
III    – a sentença homologatória de conciliação ou de transação, ainda que inclua matéria não posta em juízo; (Incluído pela Lei nº 11.232, de 2005)
IV    – a sentença arbitral; (Incluído pela Lei nº 11.232, de 2005)
(grifos nossos)

 

Logo, observa-se que tanto a arbitragem quanto o Judiciário, põem termo ao conflito, através da figura de um terceiro, também, imparcial, chamado de árbitro, no caso da arbitragem, o qual é tido por juiz de fato e de direito.

Na arbitragem, vêm-se refletidas questões de cunho patrimonial, oferecendo resoluções mais aceleradas, que as do Judiciário, aos desencontros oriundos dos contratos, anteriormente celebrados. Sendo, portanto, o meio mais apropriado para decidir conflitos advindos dos contratos internacionais.

 

5.2 CONCEITO DE ARBITRAGEM

 

No entendimento de Monteiro (2014):


Por arbitragem, pois, entende-se como sendo o meio pelo qual pessoas, empresas e instituições podem utilizar-se para solucionar controvérsias, externamente ao Poder Judiciário. Ou ainda, o processo de dissolução de conflitos por intermédio de árbitros selecionados pelas partes, ou indicados, excluindo-se a participação do Poder Judiciário no que tange à resolução da dissidência.

 

Logo, trata-se a arbitragem de um procedimento feito de forma extrajudicial, pelo qual optam quaisquer pessoas, quer sejam físicas ou jurídicas. O acesso é pleno, bastando, para tanto, a inclusão de cláusula arbitral, em termo contratual ou a sua opção pós-pacto.


A Lei de n.º 9.307/1996 (BRASIL, 1996), reguladora da Arbitragem no Brasil, é bastante eficaz ao esboçar sobre as regras de procedimento arbitral, seguindo o arquétipo da lei modelo – UNCITRAL.


Motiva, em seu artigo 1º, a resolução de demandas por meio arbitral, segundo a patrimonialidade dessas, advertindo, além de tudo, o não envolvimento de interesses de incapazes e direitos indisponíveis:


Art. 1º As pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis.

A escolha por esse meio alternativo, requer ou adicionamento de cláusula compromissória, em contrato, ou compromisso arbitral, após início no Judiciário. É o que se entende dos seguintes, verbis (BRASIL, 1996):


Art. 3º As partes interessadas podem submeter a solução de seus litígios ao juízo arbitral mediante convenção de arbitragem, assim entendida a cláusula compromissória e o compromisso arbitral.
Art. 4º A cláusula compromissória é a convenção através da qual as partes em um contrato comprometem-se a submeter à arbitragem os litígios que possam vir a surgir, relativamente a tal contrato.
§ 1º A cláusula compromissória deve ser estipulada por escrito, podendo estar inserta no próprio contrato ou em documento apartado que a ele se refira.

 

Assim, a cláusula compromissória remonta à autonomia privada e preferência por um método mais rápido e mais eficiente. O compromisso arbitral poderá se dá judicial ou extrajudicialmente, conforme entendimento abaixo consubstanciado:


Art. 9º O compromisso arbitral é a convenção através da qual as partes submetem um litígio à arbitragem de uma ou mais pessoas, podendo ser judicial ou extrajudicial.
§ 1º O compromisso arbitral judicial celebrar-se-á por termo nos autos, perante o juízo ou tribunal, onde tem curso a demanda.
§ 2º O compromisso arbitral extrajudicial será celebrado por escrito particular, assinado por duas testemunhas, ou por instrumento público.

 

Monteiro (2014) diz que as partes, além de escolher o método arbitral, elegem os árbitros e determinam as regras aplicadas:


Outrossim, é de bom alvitre destacar que a opção de pactuar pelo procedimento arbitral, pela escolha dos árbitros, bem como a forma pela qual serão elegidos, devem ser convencionadas entre as partes. Ainda, poderão recorrer a um Órgão Arbitral ou a uma Entidade Especializada, submetendo-se, pois, ao respectivo regulamento do ente preferido.

 

A arbitragem, portanto, de acordo com a autora, possui muitas vantagens, quando comparada ao procedimento judicial: mais célere; mais ampla e flexível para aceitação de provas; mais confiável, devido ao compromisso que os árbitros estabelecem e as suas especificidades; possibilidade de eleição dos direito/regras aplicáveis, do território de julgamento (MONTEIRO, 2014).


Constitui-se, enfim, como canal de solução de lides mais adequado às contratações de cunho internacional, tendo em vista que cada Estado contratante detém soberania e legislações internas específicas.

 

6. CONVENÇÃO DE COMPRA E VENDA INTERNACIONAL DE MERCADORIAS - CISG.

 

Com a presente Convenção de Compra e Venda Internacional e Mercadorias (VIENA, 1980), os Estados, entes dotados de soberania, acordaram, a um fim proveitoso e ensejador de maiores expectativas de relações/interações, desenvolvimento da economia global, conforme se depreende do preâmbulo, por oportuno referido, ipse literis:


OS ESTADOS PARTES NA PRESENTE CONVENÇÃO,
Tendo em conta os objetivos gerais inscritos nas resoluções relativas à instauração de uma nova ordem econômica internacional adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em sua sexta sessão extraordinária; Considerando que o desenvolvimento do comércio com base na igualdade e em vantagens mútuas constitui elemento importante na promoção de relações de amizade entre os Estados.
Estimando que a adoção de regras uniformes para reger os contratos de compra e venda de mercadorias, que contemplem os diferentes sistemas sociais, econômicos e jurídicos, contribuirá para a eliminação de obstáculos jurídicos às trocas internacionais e promoverá o desenvolvimento do comércio internacional. ACORDAM no seguinte: (Sem grifos no original)

 

A ratificação, pelo Brasil, da Convenção das Nações Unidas a qual ajusta a compra e venda internacional de mercadorias - CISG ou Convenção de Viena (VIENA, 1980) - se deu em 04/03/2013, vigorando a partir de 01/04/2014, que elucubra extrema importância à geração e circulação de riquezas, culminando no aumento da economia tanto local quanto global.


Imperioso destacar que, hodiernamente, praticamente, não se encontram estorvos ou impedimentos à realização de pactos, muito em virtude da globalização e do entendimento jurídico mais acentuado, no sentido de se envolver os Estados em atividades mercantis, entre si, com fito  no desenvolvimento e facilitação das afinidades. Advirta-se que isso não retira dos Entes a sua soberania, os tornando subalternos ao tribunal estrangeiro, arbitral.


De mais, aquele que se dispõe a contratar credita um mínimo de segurança ao seu negócio jurídico. Logo, ao se arrazoar acerca do comércio exterior, estima-se em maior grau essa segurança, em vista das grandes proporções gestadas pelos entes de Estados díspares.


Ainda, vê-se que a dita Convenção – CISG (VIENA, 1980) preocupou- se em delimitar em quais casos ela não seria aplicada, senão veja-se em seu artigo 2º:


Esta Convenção não se aplicará às vendas:
 
(a)      de mercadorias adquiridas para uso pessoa, familiar ou doméstico, salvo se o vendedor, antes ou no momento de conclusão do contrato, não souber, nem devesse saber, que as mercadorias são adquiridas para tal uso;
(b)      em hasta pública;
(c)       em execução judicial;
(d)      de valores mobiliários, títulos de crédito e moeda;
(e)      de navios, embarcações, aerobarcos e aeronaves;
(f)        de eletricidade.

 

O contrato de compra e venda, seja de natureza cível ou mercantil/empresarial, é considerado uma espécie que propicia maior segurança jurídica às relações jurídicas estabelecidas.


Em se tratando de comércio exterior ou internacional, a busca pela segurança supramencionada torna-se mais acirrada, visto que as partes contratantes desejam compactuar amenizando, ao máximo, os danos, até porque, em sua grade maioria, tais pactos são de referências vultuosas.

 

7. ARGUMENTOS DE CONTRARIEDADE NA FORMAÇÃO DOS CONTRATOS NA CISG E NO CCB.

 

A formação dos contratos é o ponto crucial a se ter uma correta celebração, haja vista se constituir alvo de acercamento de nulidades, por exemplo. O Código Civil Brasileiro preceitua, em seu artigo 112 (BRASIL, 2002), verbis: “Art. 112. Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem”.


Diniz (2013, p. 156) define traços para a formação do vínculo contratual, afirmando que as “negociações preliminares (tratative pourparlers) nada mais são do que as conversações prévias, sondagens e estudos sobre os interesses de cada contratante”.


Advém do raciocínio acima a ideia de ausência de obrigatoriedade, pelo menos em tese, no período denominado de pré-contratual, mais precisamente, na fase de negociações prévias.


Posteriormente, deflagra a autora supracitada, a inteligência da obrigação na etapa pré-contratual, no sentido de se assinalar que a parte que der causa aos danos, de forma injustificada e arbitrária, tem por obrigação indenizar a outra parte, que estava de boa-fé, creditando na tratativa (DINIZ, 2013, p. 157):


Apenas na hipótese de um dos participantes criar no outro a expectativa de que o negócio será celebrado, levando-o a despesas, a não contratar com terceiro ou alterar planos de sua atividade imediata, e depois desistir, injustificada e arbitrariamente, causando-lhe sérios prejuízos, terá, por isso, a obrigação de ressarcir todos os danos.

 

Sabe-se, nesse ínterim, que o acontecimento pré-contratual não contém, tão somente, as negociações preliminares, sendo constituído, também, da emissão da proposta e consequente aceitação, a fim de formar- se o contrato preliminar, objetivando o definitivo.


Assim, em relação à proposta, o CC/2002, no artigo 427, (BRASIL, 2002), aponta: “Art. 427. A proposta de contrato obriga o proponente, se o contrário não resultar dos termos dela, da natureza do negócio, ou das circunstâncias do caso”.


Do artigo anterior extrai-se a carência de conceito da oferta, policitação, contudo, percebe-se a garantia do seu sentido obrigatório, mesmo ante a inexistência de contrato propriamente dito.


Desse modo, com tom bastante elucidativo, Rizzardo (2011, p. 41), subdivide a fase preliminar ou formação contratual, em duas: negociações e proposta/aceitação. Afirma o autor (Rizzardo, 2011, p. 41) que a primeira fase se trata de “negociatória, integrada pelos atos preparatórios realizados sem intenção vinculante marcante”.


Ainda, diz que a tratativa não dispõe de eficácia Rizzardo (2011, p.42): “Trata-se de desenvolver puras negociações preliminares, quer dizer, destituídas de eficácia contratual específica”.


Posteriormente, ampara que a proposta além de ser a segunda etapa de uma primeira, qual seja pré-contratual, é o próprio desenrolar do contrato (RIZZARDO, 2011, p. 44):


A proposta vem a ser o primeiro momento no desenrolar dos atos que levam ao contrato propriamente dito. Uma das partes oferece a relação contratual pretendida a um possível interessado (...). Denominada, também, policitação, visa solicitar a manifestação de vontade da outra parte, que se denominará aceitante, desde que a escolha e aprove, a ela aderindo.

 

Lôbo (2014, p. 75), nessa direção, afirma que para existir uma formação contratual, são necessários os seguintes: a) a oferta; b) a aceitação e c) o consenso: “O contrato se forma quando uma parte (ofertante) faz uma oferta de uma prestação à outra parte (aceitante) e esta aceita, fundindo-se as duas manifestações de vontade em um acordo ou consenso”.


Para Larenz (1959, v. 1, p. 65, apud LÔBO, 2014):


Ao porem-se ambas as partes por própria e livre vontade, de acordo sobre determinadas prestações e obrigações, resultará que nenhuma dependerá do arbítrio da outra e ambas estarão em situação de velar por seus próprios interesses.

 

Dessa maneira, percebe-se que o contrato, na fase pré-contratual, possui subetapas que incluem tratativas iniciais e proposta, visando à futura pactuação. As negociações preliminares referem-se apenas à avaliação das possíveis condições para a celebração de um acordo e sua viabilidade, não gerando obrigação de contratar, mas podendo resultar em indenização, dependendo dos esforços despendidos e da retirada de uma das partes sem justificativa. A proposta vincula a vontade do proponente, e a aceitação deve ocorrer conforme os termos apresentados, pois qualquer alteração implicará em uma nova proposta.


Os artigos 428 a 435, do Código Civil Brasileiro – CCB (BRASIL, 2002), demonstram o mudus operandi da oferta e aceitação, nessa fase de pré-contratual:


Demonstra a obrigatoriedade da oferta:
Art. 428. Deixa de ser obrigatória a proposta:
I - se, feita sem prazo a pessoa presente, não foi imediatamente aceita. Considera-se também presente a pessoa que contrata por telefone ou por meio de comunicação semelhante;
II - se, feita sem prazo a pessoa ausente, tiver decorrido tempo suficiente para chegar a resposta ao conhecimento do proponente; III - se, feita a pessoa ausente, não tiver sido expedida a resposta dentro do prazo dado;
IV - se, antes dela, ou simultaneamente, chegar ao conhecimento da outra parte a retratação do proponente.

Relata sobre a oferta feita ao público, afirmando que precisará preencher os requisitos essenciais do contrato:


Art. 429. A oferta ao público equivale a proposta quando encerra os requisitos essenciais ao contrato, salvo se o contrário resultar das circunstâncias ou dos usos.
Parágrafo único. Pode revogar-se a oferta pela mesma via de sua divulgação, desde que ressalvada esta faculdade na oferta realizada.

 

Evidencia a escusa da aceitação: “Art. 430. Se a aceitação, por circunstância imprevista, chegar tarde ao conhecimento do proponente, este comunicá-lo-á imediatamente ao aceitante, sob pena de responder por perdas e danos”.


Ressalta que qualquer alteração na policitação, quando do momento da aceitação, implicará em nova proposta: “Art. 431. A aceitação fora do prazo, com adições, restrições, ou modificações, importará nova proposta”.


Corrobora com o tipo de aceitação tácita: "Art. 432. Se o negócio for daqueles em que não seja costume a aceitação expressa, ou o proponente a tiver dispensado, reputar-se- á concluído o contrato, não chegando a tempo a recusos”.


Afirma a possibilidade do aceitante se retratar: “Art. 433. Considera-se inexistente a aceitação, se antes dela ou com ela chegar ao proponente a retratação do aceitante”.


Aceitação desde a expedição:


Art. 434. Os contratos entre ausentes tornam-se perfeitos desde que a aceitação é expedida, exceto:
I - no caso do artigo antecedente;
II - se o proponente se houver comprometido a esperar resposta;
III - se ela não chegar no prazo convencionado.

 

O lugar da proposta como marco de celebração contratual: “Art. 435. Reputar-se-á celebrado o contrato no lugar em que foi proposto”.


Pereira (2013, p. 61), categoriza que o contrato dito preliminar é a espécie, por meio da qual, as partes, ou uma só delas, se comprometem a avençar o contrato chamado de principal. Ainda, reflete a autor, que a distinção entre o contrato principal e o contrato preliminar está justamente no objeto. Isto porque, naquele é a prestação a qual as partes se obrigaram. Nesse, é a obrigação de conclusão do contrato.


Seguindo a ilação o ilustre autor supracitado (PEREIRA, 2013, p. 79- 80) os mencionados contratos preliminares são dotados de efeitos, os quais são vistos após a implementação dos requisitos de validade, aplicados aos contratos, apostos, em resumo:


a)   Requisito objetivo: objeto lícito e possível.
b)   Requisito subjetivo: capacidade genérica para a vida civil.
c)   Requisito formal: deve o contrato preliminar conter os mesmos requisitos formais para a celebração do contrato, propriamente dito.

 

O requisito objetivo há de se consubstanciar na licitude e possibilidade do objeto permeado, uma vez que os ilícitos não se revestem de proteção, no Direito. Já a subjetividade remonta ao fato de que os incapazes, em regra, não podem celebrar negócios jurídicos. A formalidade dos contratos preliminares persegue a dos contratos principais, por demonstrar a perfeita vontade dos contratantes em ajustar o consubstanciado.


A policitação se traduz no sentido de que o proponente remete a emanação da sua vontade em solenizar um negócio jurídico, ao pretenso aceitante. Em havendo a aceitação, torna-se perfeito o contrato, obrigando o ofertante ao devido cumprimento, por conseguinte, estará o aceitante comprometido com a obrigação que se lhe foi imposta.


Quando da recepção da oferta o aceitante deverá emitir declaração devidamente consignada, caso não deseje quedar-se silente, o que não gerará contrato. Mas, adverte-se o bom tom de se consagrar os termos pelos quais se obriga a cumprir.

Logo, caso adicione, remova ou modifique os termos recebidos, terá, por obrigação, lançar de si declaração, tornando-se, a partir, desse momento, ofertante.


Tal fato decorre dos princípios da boa-fé objetiva, a qual reclama a inteireza, conduta correta, das partes contratantes e do consensualismo, traduzindo o real sentido do contrato, o qual é constituído sob consenso mútuo.


Admira-se que a simples oferta ou aspiração contratual é o início da celebração, daí porque se depreende de regramento específico, em Código Civil, nos artigos 427 a 435 (BRASIL, 2002).


Ademais, lembra-se que o policitante, no que toca ao envio da proposta, se compromete sobremaneira com o desempenho de sua asseveração, conforme art. 427, CC/02, supracitado.


Para Gagliano e Filho (2014, p.128), a fase de puntuação consiste em um momento prévio, no qual “as partes discutem, ponderam, refletem, fazem cálculos, estudos, redigem a minuta do com trato, enfim, contemporizam interesses antagônicos, para que possam chegar a uma proposta final e definitiva”.


Entendem os autores que não há definitividade, embora defendam o pensamento de cabimento de indenização pelos gastos fincados na expectativa legítima gerada mediante a certeza de celebração contratual definitiva.


Há de se coadunar com essas ilações, visto que não há falar em indenizações, nessa fase, excetuada pelo princípio da boa-fé objetiva.


De outra sorte, convém salientar, que a Convenção das Nações Unidas sobre Contratos de Compra e Venda Internacional de Mercadorias (VIENA, 1980), apelidada CISG (United Nations Convention on Contracts for the International Sale of Goods), foi aprovada, no Brasil, pelo Decreto Legislativo de n.º 538/2012 (BRASIL, 2012), Diário Oficial da União, de 18 (dezoito) de Outubro de 2012 (dois mil e doze), passando a gerar efeitos somente a partir de 1º (primeiro) de Abril de 2014 (dois mil e quatorze).


Segue texto do Decreto, em seu artigo 1º (BRASIL, 2012):


O Congresso Nacional decreta:
Art. 1º Fica aprovado o texto da Convenção das Nações Unidas sobre Contratos de Compra e Venda Internacional de Mercadorias, estabelecida em Viena, em 11 de abril de 1980, no âmbito da Comissão das Nações Unidas para o Direito Mercantil Internacional.

 

A aprovação da Convenção foi um marco na história da compra e venda internacional de mercadorias, no Brasil, visto que os textos nacionais não satisfizeram totalmente às regulações do mercado externo, devido às suas especificidades. Há incompatibilidade de regramentos, nesse cenário? Caso se tenha conflito entre a lei interna e a externa, qual deve ser a prevalente?


Diante dos anseios mercadológicos, entende-se que o Código Civil não seria o bastante para proteger/resguardar/resolver as relações internacionais, a uma porque ambos os contratantes iriam desejar a aplicação de suas próprias leis, a fim de se beneficiarem, a outra em virtude da globalização, mediante a qual se exige/espera uma maior agilidade do circuito do comércio, a fim de se fomentar a economia.


Coteja a Convenção das Nações Unidas (VIENA, 1980) sobre o assunto de formação contratual:


Artigo 14 - Para que possa constituir uma proposta, a oferta de contrato feita a pessoa ou pessoas determinadas deve ser suficientemente precisa e indicar a intenção do proponente de obrigar-se em caso de aceitação. A oferta é considerada suficientemente precisa quando designa as mercadorias e, expressa ou implicitamente, fixa a quantidade e o preço, ou prevê meios para determiná-lo.

 

Dessa forma, conclui-se que a norma mercantil é mais específica sendo apropriada, dessa maneira, às relações internacionais, por condicionar a vinculação da oferta, à fixação do preço, aliada à quantidade, diferentemente do tratado em lei interna.


Frise-se, por oportuno, que a utilização da norma internacional não possui caráter obrigatório a ser observado pelos consignatários, sendo, apenas, uma legislação opcional. Todavia, em que pese possuir a norma um aspecto alternativo, tem-se como a mais adequada, a esse tipo de interação. Nesse sentido, os artigos 6 e 12, da Convenção de Viena (VIENA,1980), traduzem:


Artigo 6 - As partes podem excluir a aplicação desta Convenção, derrogar qualquer de suas disposições ou modificar-lhes os efeitos, observando-se o disposto no Artigo 12.
Artigo 12 - Não se aplicará qualquer das disposições dos artigos 11 e 29, ou da Parte II desta Convenção, que permita a celebração, alteração ou rescisão do contrato de compra e venda, ou a proposta, aceitação ou qualquer manifestação de intenção, por outra forma que não a escrita, quando uma das partes tiver seu estabelecimento comercial em Estado Contratante que tenha feito a declaração prevista no artigo 96 desta Convenção. As partes não poderão derrogar nem modificar o efeito do presente artigo.

 

Conclui-se, desses textos, que as partes podem escolher, quando das negociações preliminares ou do contrato preliminar, o direito ser aplicado ao negócio jurídico pretendido, momento no qual abraçam aos ditames da norma internacional ou rechaçam-nos, cedendo lugar aos regramentos internos.


Quer se salientar, nessas linhas, que opostamente à previsão da Lei Civil Brasileira, todo ato de manifestação de vontade deve ser consubstanciado em sua forma escrita, não admitindo a tácita, quando da presença de aderentes à Convenção de Viena, sendo esse o caso do Brasil, desde 2014, quando passou a produzir efeitos no território nacional.


Segundo esse entendimento, os consignatários devem de início, exprimir as suas vontades para afastar a incidência da norma interna ou não.


O artigo 8, da Convenção de Compra e Venda Internacional (CISG) permite que, além da real intenção, haja uma interpretação da conduta do contratante, segundo o que seria razoável de se esperar. Esse tipo seria uma aceitação tácita, de um modo mais abrangente.


O preceituado no artigo 9, dessa Convenção, tem por finalidade a circulação das riquezas e, para tanto, fomenta diversas possibilidades de concluir o avençado. Nesse cenário, repara-se que as regras são mais abertas e que as partes ficam encadeadas, inclusive, com adição de usos e costumes reconhecidos no comércio. Fatos sem precedente no nosso CCB. Daí porque a CISG é mais indicada para relacionamentos entre partes de países distintos.


Há se retratar, nesse aspecto, um caso específico, ocorrido no País da Alemanha, que nos indica a importância de se fixar a quantidade do objeto avençado, seja expressa, admitindo a fixação tácita, pelos usos e costumes.


Trata-se do “Egg Case”, ou, “Caso dos Ovos”, o qual foi devidamente julgado pela “District Court Oldenburg”, em 28 de fevereiro de 1996. Nesse caso, duas empresas de diferentes Estados, quais seja: Alemanha e Holanda resolveram pactuar. A empresa holandesa planejou comprar ovos, fixando, no instante, a entrega dos mesmos, contudo, deixou de observar os detalhes da compra mercantil. Pelo que contratou 03 (três) caminhões carregados de ovos. Mas, o que seriam 03 (três) caminhões carregados de ovos? Note-se que a ausência da fixação da quantidade, de forma expressa, enseja inúmeros questionamentos.


Enfim, a questão chegou ao Tribunal Alemão, por meio da empresa Holandesa, sob o argumento de que a quantidade que recebera da empresa Alemã, não correspondia ao que ela havia esperado.


A Corte compreendeu que o número pactuado estava ocultamente delineado, visto que, ao se falar em 03 (três) carregamentos de caminhão de ovos, entendia-se que esse deveria estar com toda a sua capacidade preenchida.


Concluindo-se, o contratante Alemão teve de cumprir a oferta proposta, com base na expectativa da empresa da Holanda, por força do regime aplicado pela Convenção de Viena2[1]


Trata-se esse caso de um importante demonstrador da conexão da oferta, pela qual se ultimou da execução pactual.


Diversamente, ou ao menos questionador, ocorreu na Hungria um caso chamado de “Pratt & Whitney v. Malev”. Nesse, se pode identificar que oferta não vinculou o policitante. Essa empresa emitiu uma aceitação à oferta feita por outra dos Estados Unidos. O contrato envolvia a compra de motores de avião, sem, contudo, se fixar o exato preço, condição obrigatória encontrada na CISG, excetuada pelo motivo consignado no artigo 55, da mesma. A empresa dos Estados Unidos acionou o Judiciário para a resolução do impasse, aduzindo descumprimento contratual, tendo em vista a forma implícita estabelecida na própria peculiaridade do produto ofertado, motor de avião, invocando, assim o art. 55, da CISG (VIENA, 1980):


Artigo 55
Se o contrato tiver sido validamente concluído sem que, expressa ou implicitamente, tenha sido nele fixado o preço, ou o modo de determiná-lo, entender-se-á, salvo disposição em contrário, que as partes tenham implicitamente se referido ao preço geralmente cobrado por tais mercadorias no momento da conclusão do contrato, vendidas em circunstâncias semelhantes no mesmo ramo de comércio.

 

O Tribunal julgador compreendeu que o suprarreferido artigo não se aplicaria ao caso, tendo em vista a inexistência de método de comparação mercadológica para o mesmo. Logo, pelo fato da declaração de vontade não corresponder aos requisitos de elementos suficientes de vinculação, consoante CISG, não se poderia ultimar a avença[2].


As regras mercantis, assim como, a vinculação da proposta são bem mais acentuadas que as encontradas no CCB, pela seriedade de se envolver soberanias nas negociações.


Em regramento Brasileiro, as partes não ficam obrigadas pelo que expressam nas negociações preliminares. Porém, em ambiente internacional, os contratantes tornam-se constrangidos ao comprometido, anteriormente.


Em caso de existência de dispositivos contraditórios entre os regramentos da lei civilista e da convenção de Viena, para compra e venda internacional de mercadorias, como se pode perceber, compreende-se, portanto, que a prevalência deve ser atribuída, sem dúvidas, aos regramentos internacionais, haja vista concretizarem situações que emanam efeitos potencializadores do comércio internacional, fortalecendo a economia global. Tais regramentos, como visto, são dotados de especificidades de relações, cujos interesses são, prioritariamente, “egoístas” ou individuais, isto é, objetivam movimentação lucro com a contratação avençada, ao tempo em que norteiam países diversos, pelo que, para uma melhor compreensão, há de se implementar as orientações internacionais.

 

8. CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

A análise realizada neste estudo destaca a complexidade e a importância da policitação nos contratos internacionais de compra e venda mercantil, especialmente no contexto das negociações preliminares e da vinculação da proposta. Ao comparar a legislação interna, representada pelo Código Civil Brasileiro (CCB/2002), com a Convenção das Nações Unidas sobre Contratos de Compra e Venda Internacional de Mercadorias (CISG), ficou evidente a necessidade de priorizar a norma internacional em casos de conflito. A CISG oferece uma estrutura mais unificada e adaptada às especificidades do comércio internacional, promovendo um consenso maior entre as partes e facilitando a movimentação do mercado global.


As negociações preliminares, embora não gerem obrigação de contratar, podem resultar em indenização dependendo dos esforços despendidos e da retirada injustificada de uma das partes. A proposta, por sua vez, vincula a vontade do proponente, e a aceitação deve ocorrer conforme os termos apresentados, sob pena de se configurar uma nova proposta. Este estudo reforça que, diante de conflitos entre a legislação interna e a CISG, a norma internacional deve prevalecer para garantir maior segurança jurídica e eficiência nas transações comerciais internacionais.


A utilização da arbitragem como meio alternativo de resolução de conflitos mostrou-se eficaz, oferecendo celeridade e flexibilidade, características essenciais para o dinamismo do comércio global. A arbitragem permite que as partes escolham os árbitros e as regras aplicáveis, adaptando-se melhor às necessidades específicas dos contratos internacionais. Além disso, a CISG, ao estabelecer critérios claros para a formação e vinculação dos contratos, elimina a influência de disposições particulares, promovendo a uniformidade e previsibilidade necessárias para o desenvolvimento do comércio global.


Portanto, a aplicação das normas internacionais, como a CISG, e a utilização da arbitragem são essenciais para superar as limitações da legislação interna, garantindo um ambiente mais seguro e eficiente para as transações comerciais internacionais. Essas ferramentas jurídicas contribuem para a estabilidade e crescimento do comércio global, beneficiando todas as partes envolvidas.

 

9. REFERÊNCIAS

 

BERALDO, Leonardo de Farias. Curso de Arbitragem nos Termos da Lei 9.307/96. São Paulo: Ed. Atlas, 2014.

 

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BRASIL. Decreto Legislativo N. 538, de 2012. Aprova o texto da Convenção das Nações Unidas sobre Contratos de Compra e Venda Internacional de Mercadorias, estabelecida em Viena, em 11 de abril de 1980, no âmbito da Comissão das Nações Unidas para o Direito Mercantil Internacional. Brasília, DF. Diário Oficial do Senado, de 20 de março de 2012.

 

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VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. Contratos em Espécie, Volume III, 13ª ed. São Paulo: Atlas S.A, 2013.


[1] http://cisgw3.law.pace.edu/cases/960228g1.html / Alemanha. LG Oldenburg Caso n.º 12 O 2943/94. Data da decisão: 28 Fev. 1996. Tradução para o inglês disponível em: http://cisgw3.law.pace.edu/cases/960228g1.html /. Acesso em 10/06/2015.


[2] http://cisgw3.law.pace.edu/cases/920925h1.html. Hungria LegfelsobbBíróság. Caso n.º Gf.I. 31 349/1992/9. Data da decisão: 25 Set. 1992. Tradução para o inglês disponível em: http://cisgw3.law.pace.edu/cases/920925h1.html. Acesso em 10/06/2015

 

 

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Como citar esse artigo:


SOUZA, Maristela Palmeira de Barros. Policitação em contratos internacionais de compra e venda mercantil. Revista QUALYACADEMICS. Editora UNISV; v. 2, n. 3, 2024; p. 302-325. ISSN: 2965-9760 | DOI: doi.org/10.59283/unisv.v2n3.021



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