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Helen da Silva Madalena

ECOFEMINISMO: A MULHER E O MEIO AMBIENTE DE MANEIRA VULNERÁVEL PERANTE A MASSIFICAÇÃO DO FAST FASHION A PARTIR DA PLATAFORMA SHEIN

Atualizado: 14 de mar.

ECOFEMINISM: WOMEN AND THE ENVIRONMENT VULNERABLE TO THE MASSIFICATION OF FAST FASHION THROUGH THE SHEIN PLATFORM





Como citar esse artigo:


MADALENA, Hellen da Silva. Ecofeminismo: a mulher e o meio ambiente de maneira vulnerável perante a massificação do fast fashion a partir da plataforma Shein. Revista QUALYACADEMICS. Editora UNISV; v. 1, n. 2, 2024; p. 173-189. ISBN: 978-65-85898-43-0 - DOI: doi.org/10.59283/ebk-978-65-85898-43-0



Autor:



Hellen da Silva Madalena

Bacharel em Relações Públicas pela instituição FSG Centro Universitário. – Contato: hellen.madalena@hotmail.com.br


RESUMO


Este artigo científico explora as inter-relações entre o feminismo, o ecofeminismo e o impacto da indústria da moda sobre as mulheres e o meio ambiente, concentrando-se na massificação do fast fashion exemplificado pela plataforma SheIN. O objetivo principal do estudo é entender como a indústria da moda rápida explora mulheres e o meio ambiente, enfatizando o papel da SheIN nessa dinâmica. Os objetivos específicos incluem analisar a representação e exploração do corpo feminino e do ambiente dentro do fast fashion, compreender as influências históricas e culturais dessas práticas e investigar alternativas sustentáveis e éticas na indústria. Utilizando uma metodologia exploratória, esta pesquisa baseia-se nos quadros teóricos de Silvia Federici, Simone de Beauvoir, Judith Butler e outros para aprofundar o entendimento dessas questões. A justificativa para este estudo decorre da necessidade urgente de desvendar as camadas de exploração embutidas na indústria da moda, que frequentemente esconde sua dependência da degradação ambiental e da exploração feminina sob o disfarce do glamour e inovação. A questão central abordada é: "Como mulheres e o meio ambiente são explorados como ferramentas para a expansão do fast fashion, e como o ecofeminismo e o slow fashion oferecem caminhos de resistência?" Esta investigação é crítica para fomentar um diálogo mais amplo sobre sustentabilidade, ética e equidade na moda, visando não apenas enriquecer o entendimento acadêmico, mas também inspirar mudanças práticas nas práticas de consumo e produção. Os principais achados revelam que a indústria da moda rápida, particularmente através de plataformas como a SheIN, perpetua a objetificação das mulheres e o dano ambiental. O estudo sublinha a necessidade de uma mudança de paradigma em direção a práticas de moda mais responsáveis e sustentáveis, destacando o potencial do ecofeminismo e do slow fashion como contra-narrativas. Esta pesquisa preenche uma lacuna significativa na literatura acadêmica ao conectar o ecofeminismo, o fast fashion e a SheIN, oferecendo perspectivas inovadoras para combater as dinâmicas exploratórias da indústria da moda contemporânea.


Palavras-chave: SheIN; Feminismo; Ecofeminismo; Meio Ambiente; Fast Fashion; Slow Fashion.


ABSTRACT


This scientific article explores the interrelations between feminism, ecofeminism, and the fashion industry's impact on women and the environment, focusing on the massification of fast fashion as epitomized by the SheIN platform. The study's primary objective is to understand how the fast fashion industry exploits women and the environment, emphasizing the role of SheIN in this dynamic. Specific aims include analyzing the representation and exploitation of the female body and the environment within fast fashion, understanding the historical and cultural influences of these practices, and investigating sustainable and ethical alternatives in the industry. Employing an exploratory methodology, this research draws on the theoretical frameworks of Silvia Federici, Simone de Beauvoir, Judith Butler, and others to deepen the understanding of these issues. The justification for this study stems from the urgent need to uncover the layers of exploitation embedded within the fashion industry, which often hides its reliance on environmental degradation and female exploitation under the guise of glamour and innovation. The central question addressed is: "How are women and the environment exploited as tools for the expansion of fast fashion, and how do ecofeminism and slow fashion provide paths of resistance?" This inquiry is critical in fostering a broader dialogue on sustainability, ethics, and equity in fashion, aiming not only to enrich academic understanding but also to inspire practical changes in consumption and production practices. Key findings reveal the fast fashion industry, particularly through platforms like SheIN, perpetuates women's objectification and environmental harm. The study underscores the need for a paradigm shift towards more responsible and sustainable fashion practices, highlighting the potential of ecofeminism and slow fashion as counter-narratives. This research fills a significant gap in academic literature by linking ecofeminism, fast fashion, and SheIN, offering innovative perspectives on combating the exploitative dynamics of the contemporary fashion industry.


Keywords: SheIN; Feminism; Ecofeminism; Environment; Fast Fashion; Slow Fashion.


1. INTRODUÇÃO


Em agosto de 2015, o documentário "Glass Walls", narrado por Paul McCartney e lançado em 2007, capturou a atenção da pesquisadora com sua poderosa mensagem: "Se matadouros tivessem paredes de vidro, todos seriam vegetarianos". Este filme, ao revelar as práticas abusivas nas indústrias da carne e do leite, provocou uma profunda reflexão sobre o impacto do capitalismo nas relações entre humanos e animais. Impulsionada por essa descoberta, a autora adotou um estilo de vida vegetariano, com tendências ao veganismo, como uma forma de resistência contra a exploração animal. Esse caminho a levou a explorar conceitos mais amplos de opressão, incluindo a dominação de gênero e a exploração ambiental, culminando no seu interesse pelo ecofeminismo.


O ecofeminismo, que examina a conexão entre a opressão das mulheres e a degradação ambiental, oferece uma lente crítica para analisar a sociedade contemporânea, particularmente no contexto da indústria da moda. Esta indústria, caracterizada por sua rápida produção e descarte (conhecida como "fast fashion"), não só perpetua a objetificação feminina, mas também contribui significativamente para os danos ambientais. Este estudo focará na plataforma SheIN como um estudo de caso exemplar para entender essas dinâmicas.


A justificativa para esta pesquisa surge da observação da pesquisadora sobre a necessidade de desvendar as camadas de exploração embutidas na indústria da moda, um setor que mascara sua dependência da degradação ambiental e da exploração feminina sob o véu do glamour e da inovação. Por meio da análise do documentário "Glass Walls" e de reflexões pessoais, este artigo busca explorar a interseção entre feminismo, ecofeminismo e a crítica ao fast fashion, destacando a urgência de repensar as práticas de consumo e produção na moda.


Os objetivos específicos desta investigação incluem: analisar a representação e exploração do corpo feminino e do meio ambiente no fast fashion, entender a influência histórica e cultural dessas práticas, e investigar alternativas sustentáveis e éticas dentro da indústria. Através de uma metodologia exploratória, o trabalho se apoia em teóricos como Silvia Federici, Simone de Beauvoir, e Judith Butler, para aprofundar a compreensão sobre estas questões.


Este estudo levanta a questão central: "Como o feminino e o meio ambiente são explorados como ferramentas para a expansão do fast fashion, e de que maneira o ecofeminismo e o slow fashion oferecem caminhos de resistência?" Com a esperança de contribuir para um diálogo mais amplo sobre sustentabilidade, ética e equidade na moda, este trabalho visa não apenas aprofundar o entendimento acadêmico, mas também inspirar mudanças práticas no consumo e na produção de moda.


2. CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DO FEMINISMO X O CORPO COMO PRODUTO


Desde tempos imemoriais, a mulher ocupou uma posição de submissão frente ao homem, sendo vista ora como sua escrava, ora como sua vassala. A desigualdade entre os sexos tem sido uma constante ao longo da história, e, como destaca Simone de Beauvoir (1949), mesmo com os avanços significativos na atualidade, as mulheres continuam enfrentando inúmeras barreiras.


Este capítulo visa explorar a trajetória do feminismo, desde suas origens até a contemporaneidade, analisando a complexa relação de poder entre homens e mulheres, moldada por contextos históricos, políticos, culturais e sociais. O feminismo, em sua luta por igualdade de gênero, questionou e desafiou percepções tradicionais sobre o corpo feminino e seu papel na sociedade.


Silvia Federici (2004), em "Calibã e a Bruxa: Mulheres, Corpos e Acumulação Primitiva", argumenta que historicamente as mulheres foram marginalizadas e exploradas de maneira semelhante à escravidão. Federici discorre sobre como, especialmente na transição do feudalismo para o capitalismo, houve uma perseguição sistemática às mulheres acusadas de bruxaria, marcando um genocídio contra o feminino. Esta caça às bruxas evidenciou o controle sobre a sexualidade feminina e a autonomia das mulheres, impondo um regime de terror que visava silenciar e punir qualquer desvio dos papéis tradicionais femininos.


A perseguição às "bruxas" visava reprimir as mulheres que desafiavam o status quo, ligando diretamente a ascensão do capitalismo com a intensificação da opressão feminina. Federici (2004) ilumina a maneira pela qual o capitalismo exacerbou a subjugação feminina, vinculando-a à expropriação de terras e à marginalização do trabalho feminino. Este processo não apenas afastou as mulheres dos meios de produção, mas também consolidou uma estrutura patriarcal que instrumentalizou o corpo feminino para controle populacional e reforço da produtividade.


As bruxas, então, representavam mulheres que resistiam e questionavam a ordem patriarcal e capitalista, sendo perseguidas como meio de reafirmar o domínio masculino e o nascente sistema econômico. Federici (2004) destaca os julgamentos por bruxaria como um momento crucial de repressão feminina, simbolizando a tentativa de erradicar qualquer forma de saber e prática feminina que ameaçasse a ordem estabelecida.


O movimento feminista, que luta por direitos políticos, culturais e jurídicos, tem evoluído ao longo dos anos para incorporar novas questões sociais e interseções com outras lutas por igualdade e justiça. Essa abordagem interseccional, termo que será abordado ao longo do presente trabalho, possibilita uma compreensão mais aprofundada das desigualdades e da interseção entre diferentes formas de opressão e discriminação presentes, tem sido fundamental para a conquista de direitos civis e políticos não apenas para as mulheres, mas também para aqueles que não se encaixam no padrão masculino patriarcal que dominava o cenário jurídico anteriormente.


Para compreender como o corpo é percebido e sentido na atualidade, é importante fazer uma breve retrospectiva histórica e entender como o corpo foi concebido ao longo do tempo. Para Goellner (2003), pensar o corpo como histórico é pensar a sua estrutura a partir da cultura e da linguagem. Esta visão rompe com a forma naturalista pela qual o corpo foi pensado, explicado, classificado e tratado.


No início do feminismo contemporâneo, uma das ideias fundamentais foi a afirmação de que nosso corpo nos pertence, reconhecendo-o como um elemento central nas relações de poder entre os gêneros, tanto no espaço público quanto no privado. Esse princípio representou não apenas um grito coletivo por liberdade e resistência, mas também uma tentativa de dar um novo significado ao corpo, questionando as formas de disciplina e controle que o afetam. O discurso feminista passou a incluir um debate político sobre o corpo e os direitos humanos, reconhecendo e reivindicando suas diferenças e liberdades, e lutando contra o controle social ao qual ele era submetido. Esse movimento foi fundamental para a ampliação dos direitos e liberdades individuais e para a desconstrução de normas e padrões que limitavam a autonomia e a dignidade dos corpos.


A luta pelo empoderamento feminino tem uma longa história e não é uma causa exclusiva de indivíduos ou organizações isoladas. É uma luta que requer o envolvimento de todos que buscam fortalecer a igualdade de gênero nos setores em que as mulheres são minoria. Embora a conquista da liberdade e autonomia sexual seja uma dimensão fundamental do movimento feminista, não pode ser vista como a única estratégia para enfrentar o machismo e o sistema capitalista. É necessário um processo constante de conscientização feminista, que visa a desalienação do corpo, da vida e do trabalho.


Em sua obra (Bio)Ética Ambiental, José Roque Junges (2010, p. 31) explica que o ecofeminismo destaca "o caráter e o significado das relações entre o modo de tratar a mulher e a natureza". Dessa forma, existe uma interdependência específica entre a sociedade patriarcal e a subjugação da natureza.


Nessa abordagem, o ecofeminismo enxerga no sistema patriarcal a origem da catástrofe ecológica atual, tendo sido a natureza e as mulheres - ambas associadas à reprodução da vida - o alvo das agressões desse sistema. Nessa perspectiva, o patriarcado se exprime com a mesma lógica do poder machista, opressor e totalitário da agroindústria, atacando os fundamentos da vida, na sua expressão simbólica mais profunda: a fecundidade do ser vivo. Daí a luta de feministas pela libertação da mulher oprimida, na relação de gênero, estar associada ao movimento ecofeminista de libertação da mulher e da natureza, ambas exploradas.


A introdução do conceito de Indústria Cultural por Theodor Adorno e Max Horkheimer em 1947 na obra "Dialética do Esclarecimento" trouxe à tona a manipulação da cultura para fins comerciais, transformando-a em mercadoria e promovendo o consumismo. Esta abordagem sugere que a cultura massificada influencia padrões estéticos e comportamentais, levando a uma passividade do consumo e a uma homogeneização cultural.


Essa dinâmica impacta diretamente a percepção do corpo feminino, que é moldado e explorado pela mídia, associando a imagem da mulher à beleza conforme padrões estabelecidos pela Indústria Cultural. Joana de Vilhena Novaes (2010) destaca como a cultura induz mulheres a buscarem um ideal estético inatingível, resultando em uma objetificação do corpo feminino que se alinha aos interesses do capitalismo.


Mirian Goldenberg (2011) reforça a ideia do corpo como um capital, onde a estética padronizada impõe às mulheres a pressão de se enquadrarem em modelos de beleza irreais, alimentados pela publicidade e mídia. Essa pressão leva à insatisfação corporal e ao consumo desenfreado de produtos que prometem a adequação a esses padrões.


Adorno e Horkheimer (1947) já alertavam sobre a manipulação das massas e a imposição de padrões pela Indústria Cultural, que transforma a cultura em instrumento de alienação. Essa lógica não apenas afeta a identidade feminina, mas também tem implicações ambientais, como demonstrado pela produção poluente da indústria da moda.


A exploração do corpo feminino e a degradação ambiental, portanto, são duas faces da mesma moeda, ambas resultado da lógica capitalista que sustenta a Indústria Cultural. Essa conexão sublinha a importância de práticas mais sustentáveis e equitativas, que respeitem tanto os indivíduos quanto o meio ambiente, desafiando o sistema que perpetua a objetificação e a exploração.


Desta forma, haveria necessidade urgente de unir a luta pelos direitos das mulheres à luta em defesa da natureza. Pressupõe-se que a lógica da ciência seja contra a vida e contra a mulher e que a superação de tal cenário de opressão seja feita de forma positiva e libertadora. Com o conhecimento de nossas origens, do nosso presente e dos nossos desejos, pode-se conhecer as conexões entre a vida de cada planta, animal e ser humano, formando um só corpo com o planeta. O ecofeminismo voltará a ser abordado, com mais destaque, ao decorrer do presente trabalho.


3. A CASE DE SUCESSO SHEIN EM CONTRASTE COM O ECOFEMINISMO


A SheIN, fundada por Chris Xu em 2008, destacou-se no mercado de fast fashion, alcançando rapidamente uma posição de liderança no e-commerce brasileiro em 2020, superada apenas pela Amazon e pela Shopee. Inicialmente focada em vestidos de noiva, a empresa reinventou-se, concentrando-se na moda rápida feminina sob o domínio "Sheinside.com", antes de se transformar em SheIN em 2015. A marca construiu sua reputação ao controlar integralmente a cadeia de produção em Guangzhou, capital da manufatura de vestuário na China (Ellen, 2023).


Sua popularidade entre a Geração Z, ao lado de gigantes como Nike e Crocs, foi destacada por um estudo da BoF, segundo Estevão (2022). Em 2022, a SheIN viu seu faturamento no Brasil saltar 300%, alcançando R$ 8 bilhões. Com um valor de mercado de US$ 100 bilhões, a empresa baseia seu sucesso em uma comunicação eficaz e marketing direcionado, mas enfrenta críticas pela exploração trabalhista e padrões estéticos promovidos, além de questões ambientais não consideradas nos custos de seus produtos.


Sua cadeia produtiva, voltada para o digital e baseada em tendências da mídia, permite um lançamento constante de novos produtos. No entanto, acusações de violação de direitos autorais e processos judiciais por plágio mancham sua imagem. A estratégia de preços baixos e ampla variedade de produtos é apontada como chave para seu sucesso, embora esteja atrelada a um modelo de consumo questionável quanto à sustentabilidade e ética (Jones, 2021; The Guardian, 2022).


A presença online da SheIN é fortalecida por uma estratégia de marketing digital que aproveita tendências emergentes e comportamento do consumidor. A marca enfrenta a concorrência não só com gigantes estabelecidos do mercado de moda mas também com imitadores, como a Choies, adaptando-se através de uma gestão eficiente dos gastos com publicidade e parcerias com influenciadores digitais.


As escolhas de produtos e modelos da SheIN, que frequentemente aderem a padrões de beleza estreitos, refletem o impacto da globalização na moda, promovendo uma "identidade cultural global" em detrimento das particularidades locais. A empresa emprega algoritmos sofisticados para personalizar a experiência de compra, destacando-se pela agilidade em responder às tendências de moda e pela capacidade de influenciar o comportamento do consumidor através de suas plataformas digitais.


Apesar dos atrativos como preços acessíveis e novidades constantes, a SheIN é um reflexo das complexidades da moda globalizada, entre o sucesso comercial e os desafios éticos e ambientais. A marca exemplifica como o consumo moderno é mediado pela tecnologia, oferecendo lições sobre as dinâmicas de poder na indústria da moda no contexto da sociedade líquido-moderna descrita por Bauman (2007).


3.1 Impacto social e ambiental


Conforme analisado, a sociedade contemporânea tende a aceitar produtos da Indústria Cultural sem questionamento, levada pelos princípios do consumismo e influenciada por criadores de conteúdo e a própria indústria. Essa dinâmica favorece a exploração de recursos naturais e humanos, contribuindo para problemas ambientais e sociais severos. A prática de "moda descartável", exemplificada pelo setor de fast fashion e particularmente pela SheIN, exemplifica esse modelo insustentável, marcado pelo consumo excessivo e pela produção de resíduos significativos.


A SheIN, criticada por danos ambientais, exploração trabalhista e violações de direitos autorais, reflete os desafios éticos enfrentados pela indústria. Casos de insensibilidade cultural e práticas questionáveis de produção aceleram a necessidade de revisão e transparência nas criações da indústria. A superprodução e o consequente desperdício representam desafios críticos, exigindo uma reconsideração do modelo de produção e a adoção de práticas mais sustentáveis, como a análise de previsão de compra para evitar excesso de produção e impactos ambientais.


Em resposta às críticas, a SheIN lançou iniciativas visando sustentabilidade e impacto social positivo, incluindo a coleção "evoluSHElN" com materiais reciclados e apoio a organizações focadas em questões sociais. No entanto, a marca ainda enfrenta escrutínio sobre sua cadeia de produção e a veracidade de suas alegações ambientais e sociais.


As práticas trabalhistas da SheIN, especialmente nas fábricas chinesas, levantaram questões sobre as condições de trabalho e o cumprimento das leis locais e internacionais. Revelações sobre longas jornadas de trabalho, baixa remuneração e condições inadequadas sublinham a necessidade de uma mudança significativa no setor.


O impacto ambiental da indústria da moda, com o uso intensivo de poliéster e a problemática das embalagens plásticas, ressalta a urgência de soluções para reduzir a poluição e promover uma economia circular. A SheIN's busca por reduzir sua pegada ambiental através de embalagens mais sustentáveis e o uso de materiais reciclados é um passo na direção certa, mas a eficácia dessas medidas permanece questionável.


A popularidade da SheIN entre as novas gerações, apesar da crescente conscientização sobre sustentabilidade, evidencia a complexidade de equilibrar acessibilidade e responsabilidade ambiental e social. Enquanto algumas práticas da SheIN refletem esforços para mitigar seu impacto, a magnitude de sua operação e o modelo de ultrafast fashion apresentam desafios significativos para a sustentabilidade a longo prazo.


Em suma, a indústria da moda, exemplificada pela SheIN, enfrenta a difícil tarefa de reconciliar a demanda por moda acessível com a necessidade premente de práticas mais sustentáveis e éticas. A transparência, a responsabilidade e o engajamento do consumidor em escolhas mais conscientes emergem como elementos cruciais para direcionar a indústria rumo a um futuro mais sustentável.


4. ANÁLISE


Este debate abordará a maneira pela qual o sistema capitalista objetifica tanto mulheres quanto o meio ambiente, tratando-os como recursos disponíveis para exploração e consumo. Exploraremos a intrincada relação entre a crise ecológica e os sistemas que desvalorizam o que é natural e feminino, destacando como essa dinâmica perpetua ciclos de opressão e degradação ambiental.


A discussão se aprofundará no ecofeminismo, uma abordagem que ilumina a conexão entre a opressão de gênero e a destruição ambiental. Examinaremos os princípios do ecofeminismo, que advoca por uma reavaliação dos valores e práticas sociais para fomentar tanto a igualdade de gênero quanto a sustentabilidade ambiental. Esta perspectiva enfatiza a necessidade de uma sociedade que respeite tanto as mulheres quanto o planeta, reconhecendo a interdependência entre a saúde do meio ambiente e a liberação das mulheres de sistemas opressores.


Além disso, introduziremos o conceito de slow fashion como um contraponto ao fast fashion, ressaltando sua ênfase na produção ética, sustentável e de alta qualidade. Discutiremos a importância de mudar nossos padrões de consumo para valorizar o trabalho manual, a longevidade das peças e a minimização do impacto ambiental. O slow fashion representa uma alternativa viável que desafia o consumismo desenfreado, promovendo práticas mais conscientes e sustentáveis na indústria da moda.


Por fim, esta análise buscará inspirar uma reflexão crítica sobre como podemos coletivamente repensar e remodelar nossa relação com a moda, as mulheres e o meio ambiente, direcionando-nos para um futuro mais equitativo e sustentável.


4.1 Mulher e meio ambiente unidos e coisificados


Desde os primórdios, a sociedade tem sido estruturada sob um sistema patriarcal, onde o homem se estabeleceu como dominante, detendo poder sobre terras, o meio ambiente e o corpo feminino. Esse domínio se reflete na tentativa de vincular homens à cultura e mulheres à natureza, sugerindo que enquanto homens e cultura representam a inovação, mulheres e natureza devem ser dominadas. Esta dicotomia tem raízes na obra de Sherry Ortner (1972) "Is Female to Male as Nature is to Culture?", que discorre sobre a subordinação das mulheres nas sociedades patriarcais, comparável à dominação cultural sobre a natureza. Esta visão perpetua hierarquias de gênero, desvalorizando mulheres e limitando sua participação ativa na sociedade.


O machismo, enraizado em diversos sistemas de dominação, também está ligado à exploração ambiental, refletindo a visão de que tanto mulheres quanto a natureza são recursos a serem utilizados. Nesse contexto, o feminismo busca desmantelar essas estruturas de poder, abordando a crise ecológica e a opressão de gênero como questões interligadas.


Introduzimos o conceito de slow fashion como uma alternativa ética e sustentável ao fast fashion, que promove a valorização do artesanato, a durabilidade das peças e a redução do impacto ambiental. Esse movimento enfatiza a importância de repensar nossos hábitos de consumo, privilegiando práticas que respeitem tanto as pessoas quanto o planeta.


A associação patriarcal entre mulheres e natureza contribui para a coisificação de ambos, tratados como objetos a serem explorados. Este paradigma é evidenciado na indústria da moda, que explora a mão de obra feminina e promove padrões de beleza inatingíveis, reforçando a objetificação do corpo feminino. Valeska Zanello (2022) utiliza a metáfora da "prateleira do amor" para discutir como os padrões estéticos influenciam a percepção do valor das mulheres, marginalizando aquelas que se desviam do ideal branco, magro e jovem.


A mercantilização do corpo, através da indústria da beleza e das tendências de moda, exemplifica a exploração do feminino, semelhante à degradação ambiental. Estamos imersos numa era líquido-moderna, segundo Bauman (2007), onde a adesão inconsciente a padrões consumistas é comum, afetando nossa percepção de beleza e autoestima.


As práticas de consumo e representação corporal nas mídias sociais evidenciam a exclusão de corpos que não se enquadram nos estereótipos aceitos, promovendo a ideia de que alguns corpos são menos válidos. É necessário desafiar essas normas e promover a inclusão e a diversidade, valorizando todas as formas de beleza e contribuindo para uma sociedade mais justa e igualitária.


O ecofeminismo ressalta a interconexão entre a opressão das mulheres e a exploração ambiental, criticando o sistema patriarcal que subjuga tanto as mulheres quanto o meio ambiente. Esta abordagem aponta para a necessidade de repensar nossas relações com a natureza e uns com os outros, buscando soluções sustentáveis e igualitárias para os desafios contemporâneos.


4.2 Ecofeminismo e o Slow Fashion, uma solução?


A pesquisa até o momento sublinha a urgência de soluções para as crises entrelaçadas do meio ambiente e da opressão de gênero. As discussões sobre a crise ambiental, ampliadas pela tecnologia, enfatizam a conexão entre a degradação ecológica e os desafios enfrentados pelas gerações atuais e futuras. Este momento crítico exige abordagens integradas que não separem a crise ambiental da opressão das mulheres, reconhecendo sua interconexão.


O patriarcado capitalista, consolidado ao longo dos séculos, marginaliza tanto a criatividade da natureza quanto das mulheres, favorecendo uma visão que reduz a terra a matéria-prima e os seres humanos a mero "trabalho". Este modelo promove a acumulação de riquezas à custa de violência e exploração, desconsiderando a interdependência essencial entre mulheres, natureza e sociedade.


Contrastando com a abordagem predatória do fast fashion, surge o movimento slow fashion, oriundo do slow food, Johansson (1986), propondo uma alternativa baseada em práticas sustentáveis e éticas na moda. Este movimento valoriza a transparência, a durabilidade e o impacto socioambiental positivo das peças, desafiando o consumo acelerado e impessoal característico do fast fashion.


O slow fashion, definido por Yan Watson (2013) como uma produção consciente e deliberadamente mais lenta, enfatiza a conexão entre consumidores e produtores, e a importância de materiais e processos sustentáveis. Eleonor Johansson (2010) vê o slow fashion como uma resposta crítica à indústria acelerada, promovendo valores de comunidade, sustentabilidade e diversidade.


Este modelo de moda propõe uma economia que respeita tanto as pessoas quanto o planeta, destacando-se pela valorização do localismo, da diversidade e da qualidade. Fletcher e Grose (2011) argumentam que o slow fashion envolve uma consciência ampliada dos impactos ambientais e sociais dos produtos, incentivando uma produção responsável e consciente.


Contudo, a acessibilidade financeira permanece como um desafio no slow fashion, sugerindo a necessidade de explorar alternativas como brechós e upcycling que promovam inclusão e diversidade. Esta abordagem busca um equilíbrio entre qualidade, sustentabilidade e acessibilidade, desafiando o modelo de consumo predominante e apontando para um futuro mais justo e sustentável na moda.

Brechós, ou "second hand", reforçam a prática de reutilizar e valorizar roupas usadas, promovendo consumo consciente e sustentabilidade. Esta tendência, além de eco-amigável, permite uma nova vida a peças com história, incentivando um ciclo de moda mais significativo e pessoal. Os brechós favorecem o consumo local e apoiam pequenos empreendedores, refletindo uma postura positiva em relação ao consumo responsável.


Por outro lado, o "upcycling", ou reutilização criativa, representa uma inovação na moda, propondo novos usos para materiais descartáveis. Christopher Raeburn (2017) destaca que sustentabilidade é fundamental em suas coleções, conforme ilustrado pelo seu lema "Reduzir, Reutilizar, Reciclar e Raeburn". Sua coleção REMADE é notável por transformar materiais como paraquedas e tecidos militares em peças contemporâneas, demonstrando o potencial do upcycling em prolongar o ciclo de vida dos materiais e reforçar a circularidade na moda.


O slow fashion, em contraste com o fast fashion, propõe uma moda ética e consciente. Deweik e Morace (2012) discutem a emergência de uma ética sustentável que visa comportamentos e processos para minimizar impactos ecológicos, promovendo uma consciência coletiva sobre a importância de práticas simples, eficientes e respeitosas ao meio ambiente.


Brechós e práticas de upcycling, portanto, desafiam os efeitos prejudiciais da moda rápida, oferecendo alternativas que celebram a individualidade, a expressão pessoal e um desapego da cultura do consumo excessivo. Eles incentivam a autenticidade e a apreciação por peças que refletem a personalidade e os valores individuais.


O ecofeminismo, enraizado na compreensão de que humanos e natureza são interconectados, defende que tanto mulheres quanto o meio ambiente não devem ser vistos como objetos passivos de exploração. Bassoli (2020) traça um histórico do ecofeminismo, destacando críticas ao essencialismo e incorporando perspectivas materialistas e anarquistas, enriquecendo o movimento com novas dimensões.


Flores e Trevisan (2015) e Saffioti (2000) ressaltam que tanto mulheres quanto a natureza são subjugadas sob o patriarcado, sustentando sistemas de dominação e exploração. O ecofeminismo, portanto, busca desmantelar esses paradigmas, propondo a libertação simultânea das mulheres e da natureza.


Karen Warren, Lori Gruen, Linda Birke, Katrina Albright, Greta Gaard, entre outras, têm contribuído para expandir o ecofeminismo, vinculando-o à ética do cuidado e aos direitos dos animais, promovendo uma visão integrada da libertação feminina e ambiental. Gaard (2011) argumenta que a libertação das mulheres está intrinsecamente ligada à libertação da natureza, desafiando as formas de dominação humana e ambiental.


Em suma, o ecofeminismo e o slow fashion representam movimentos fundamentais na busca por um futuro mais justo e sustentável, desafiando práticas de consumo predatórias e propondo alternativas que respeitam tanto as pessoas quanto o planeta.


O ecofeminismo destaca a crítica à lógica dominante dos dualismos hierárquicos, fundamentais nos sistemas de opressão e exploração patriarcal. Kuhnen (2017) aponta a importância dessa análise teórica para compreender como essas divisões binárias sustentam práticas de dominação. Bell Hooks (2020) defende a organização em comunidades como essencial à sobrevivência humana, contrapondo-se à ideologia individualista e às estruturas familiares nucleares.


Reis e Lemgruber (2020) discutem como os dualismos homem/mulher, cultura/natureza, entre outros, estabelecem exclusões e hierarquias prejudiciais. O ecofeminismo desafia essas dicotomias, promovendo uma revisão das bases filosóficas que as sustentam. Lahar (2003) critica a visão de mundo cartesiana e atomística que perpetua a dominação, afetando negativamente grupos marginalizados e o meio ambiente.


Esse pensamento ecofeminista é reforçado por Vandana Shiva, Maria Mies e Bina Agarwal (2013), que, rejeitando o essencialismo, veem a associação entre mulheres e natureza como uma construção social e histórica. No Brasil, a adesão ao ecofeminismo por movimentos femininos camponeses, destacada por Schnorrenberger e Angelin (2018), evidencia a integração entre a luta pelos direitos das mulheres e a causa ambiental.


Siliprandi (2000) enfatiza a necessidade de um modelo de produção sustentável que valorize a cultura local e a qualidade de vida, em sintonia com a abordagem do slow fashion. O ecofeminismo busca mitigar os impactos ambientais e promover bem-estar, desafiando o sistema socioeconômico atual em favor de uma maior sustentabilidade e inclusão.


Portanto, o ecofeminismo, tanto como teoria quanto como movimento, exige uma transformação cultural profunda e uma conscientização sobre as questões ambientais. É crucial que valores de sustentabilidade permeiem o sistema socioeconômico, afastando-se da exclusão baseada em gênero, raça ou classe e da exploração ambiental. A comunicação tem um papel vital na promoção dessa transformação, desafiando narrativas dominantes e promovendo discursos que favoreçam a equidade e a sustentabilidade. Isso inclui uma reavaliação do papel dos comunicadores na sociedade, buscando estratégias que englobem todos os públicos e contribuam para a desconstrução de preconceitos arraigados.


5. CONSIDERAÇÕES FINAIS


Este trabalho iniciou-se com a investigação de duas premissas fundamentais: a interseção entre o feminismo e o meio ambiente na indústria da moda e o papel da mulher e da natureza como instrumentos de exploração no sistema capitalista.


Ao longo da pesquisa, foi possível aprofundar o entendimento sobre o movimento feminista, suas demandas históricas e a forma como a indústria cultural, sob influência de uma estrutura patriarcal, perpetua a dominação sobre mulheres e o meio ambiente, especialmente por meio do fast fashion. Identificou-se que o modelo fast fashion não apenas explora o corpo feminino e os recursos naturais como também solidifica a dominação masculina, enraizada no patriarcado.


A investigação da evolução da indústria cultural e sua massificação na moda revelou como a publicidade e os meios de comunicação exploram desejos e subjetividades para promover a identificação com seus produtos, perpetuando assim um ciclo de consumo que compromete a autonomia individual e contribui para a manutenção do status quo capitalista.


Através da metodologia exploratória, este estudo respondeu como o feminino e o meio ambiente são cooptados pela expansão do fast fashion e discutiu as contraposições propostas pelo ecofeminismo e pelo slow fashion, indicando caminhos para uma moda mais sustentável e ética. Este enfoque permitiu não apenas responder à questão de pesquisa inicial, mas também ampliar o debate para outras vertentes feministas, destacando a importância de integrar as lutas feministas às transformações sociais e ambientais necessárias.


O caso da SheIN ilustrou de forma crítica como o consumo nessa plataforma reflete valores culturais e individuais, apontando para a urgência de reavaliar os padrões de consumo e as tendências impostas pela sociedade contemporânea. Essa análise evidenciou um ciclo prejudicial de padrões estéticos inatingíveis, consumo exacerbado e impacto ambiental negativo, desafiando a responsabilidade exclusiva atribuída ao fast fashion e apontando para uma problemática mais ampla na indústria da moda.


O estudo contribuiu para a discussão sobre a necessidade de abordagens mais holísticas em relação à natureza e à vida, superando a lógica dualista e hierárquica do patriarcado. O pensamento ecofeminista, especialmente no campo da ética, emerge como uma proposta valiosa para reconstruir relações mais justas e sustentáveis, indo além da instrumentalização da natureza e reconhecendo o valor intrínseco de todas as formas de vida.


Finalmente, este trabalho destacou a importância de novos modelos de organização social e de uso da mídia e comunicação, que questionem tanto a ordem econômica quanto a exploração da natureza e do corpo. Frente à crise ecológica atual, é imperativo repensar nossas práticas e visões de mundo. O conhecimento gerado por esta pesquisa oferece não apenas insights acadêmicos, mas também novas percepções sobre o impacto da indústria cultural em nossas vidas, sublinhando a necessidade de consumir de maneira mais consciente e crítica.


A realização deste estudo constitui uma etapa significativa na trajetória acadêmica e pessoal da autora, incentivando uma reflexão contínua sobre as escolhas e práticas cotidianas e reforçando o valor da pesquisa científica como ferramenta para o avanço do conhecimento e para a promoção de mudanças sociais positivas.


6. REFERÊNCIAS


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publicação de artigo científico

Esse artigo pode ser utilizado parcialmente em livros ou trabalhos acadêmicos, desde que citado a fonte e autor(es).



Como citar esse artigo:


MADALENA, Hellen da Silva. Ecofeminismo: a mulher e o meio ambiente de maneira vulnerável perante a massificação do fast fashion a partir da plataforma Shein. Revista QUALYACADEMICS. Editora UNISV; v. 1, n. 2, 2024; p. 173-189. ISBN: 978-65-85898-43-0 - DOI: doi.org/10.59283/ebk-978-65-85898-43-0


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