AN ANALYSIS OF THE APPLICATION OF THEORIES LIMITING FUNDAMENTAL RIGHTS IN BRAZILIAN JURISPRUDENCE: IS IT POSSIBLE TO HAVE CONSENSUS?
Como citar esse artigo:
RAMUNDO, Andressa Maria Ramos. Uma análise da aplicação das teorias limitadoras dos direitos fundamentais na jurisprudência brasileira: é possível haver consenso? Revista QUALYACADEMICS. Editora UNISV; n.2, v.2. 2024, p. 05-14. ISBN 978-65-85898-49-2 | D.O.I.: doi.org/10.59283/ebk-978-65-85898-49-2
Autora:
Andressa Maria Ramos Ramundo
Delegada de polícia do Estado do Rio de Janeiro. Bacharel em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro. – Contato: mrr.andressa@gmail.com
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RESUMO
O presente artigo aborda um breve estudo sobre as teorias interna e externa na limitação dos direitos fundamentais e sua aplicação pelo Supremo Tribunal Federal (STF), buscando entender como essas teorias influenciam o entendimento jurisprudencial dos direitos e suas restrições. O objetivo geral do estudo é examinar como o STF aplica as teorias interna e externa para delimitar os direitos fundamentais, com o intuito de identificar um possível consenso na jurisprudência; com objetivos específicos de: Descrever as características e diferenças entre a teoria interna e a teoria externa de limitação dos direitos fundamentais; Analisar casos específicos em que o STF aplicou essas teorias para entender o impacto prático dessas aplicações; Propor uma solução que possa harmonizar a aplicação dessas teorias, visando maior consistência e transparência jurisprudencial. Em sua metodologia, o estudo de revisão emprega uma abordagem qualitativa, analisando decisões jurisprudenciais relevantes do STF e interpretando as implicações legais das teorias interna e externa com base na literatura jurídica existente sobre direitos fundamentais. A investigação se justifica pela necessidade de compreender como as teorias de limitação dos direitos fundamentais são aplicadas de maneira dispersa pelo STF, considerando a importância desses direitos como pilares do Estado Democrático de Direito. A análise busca contribuir para um diálogo mais coerente e fundamentado sobre a proteção constitucional e suas limitações. O estudo conclui que, apesar das diferenças conceituais entre as teorias interna e externa, a prática do STF mostra que o resultado prático de ambas é similar, permitindo pré-determinar o conteúdo de um direito e sua subsequente limitação por outros direitos. A pesquisa defende a adesão à teoria externa como meio de alcançar maior clareza e fundamentação nas decisões judiciais, sugerindo que esta abordagem pode melhor representar os princípios do Estado Democrático de Direito por impor um ônus argumentativo maior aos julgadores ao restringir direitos fundamentais.
Palavras-chaves: Direitos Fundamentais; Teoria Interna; Teoria Externa; Jurisprudência do STF.
ABSTRACT
This article presents a brief study on the internal and external theories in the limitation of fundamental rights and their application by the Brazilian Supreme Federal Court (STF), aiming to understand how these theories influence the judicial interpretation of rights and their restrictions. The general objective of the study is to examine how the STF applies the internal and external theories to delineate fundamental rights, with the intent to identify a possible consensus in the jurisprudence. Specific objectives include: Describing the characteristics and differences between the internal and external theories of limiting fundamental rights; Analyzing specific cases where the STF applied these theories to understand the practical impact of these applications; Proposing a solution that could harmonize the application of these theories, aiming for greater consistency and transparency in jurisprudential decisions. In its methodology, the review study employs a qualitative approach, analyzing relevant STF judicial decisions and interpreting the legal implications of the internal and external theories based on existing legal literature on fundamental rights. The research is justified by the need to understand how the theories of limitation of fundamental rights are applied in a dispersed manner by the STF, considering the importance of these rights as pillars of the Democratic Rule of Law. The analysis seeks to contribute to a more coherent and substantiated dialogue on constitutional protection and its limitations. The study concludes that, despite the conceptual differences between the internal and external theories, the STF's practice shows that the practical result of both is similar, allowing for the pre-determination of a right's content and its subsequent limitation by other rights. The research advocates for the adoption of the external theory as a means to achieve greater clarity and substantiation in judicial decisions, suggesting that this approach can better represent the principles of the Democratic Rule of Law by imposing a greater argumentative burden on judges when restricting fundamental rights.
Keywords: Fundamental Rights; Internal Theory; External Theory; STF Jurisprudence.
1. INTRODUÇÃO
Inúmeros são os conceitos doutrinários e jurisprudenciais acerca dos direitos fundamentais. José Afonso da Silva, por exemplo, define-os como prerrogativas e instituições que se concretizam em garantias de uma convivência digna, livre e igual de todas as pessoas[1]. Já Ingo Sarlet os compreende como posições jurídicas reconhecidas e protegidas na perspectiva do direito constitucional interno dos Estados[2]. Num ou noutro sentido, há consenso com relação à sua essencialidade, representando-se como fundamentos mínimos sem os quais o ser humano não é capaz de existir dignamente.
Diz-se que essas prerrogativas se manifestam em três gerações, ou, como a doutrina hodierna prefere, dimensões. Em síntese, a primeira geração ou dimensão representa os direitos negativos, os quais impõem abstenção do Estado, a fim de garantir a plena liberdade do indivíduo na típica sociedade liberal. Após, os direitos sociais ou positivos, caracterizados pela intensa intervenção estatal para garantir o mínimo existencial à população. Por fim, os direitos de solidariedade, que possuem titularidade indeterminada e coletiva.
Nota-se que a vida do homem em sociedade apresenta complexidades que impede consenso acerca da eficácia desses direitos. A própria visualização de uma convivência plena entre as três mencionadas dimensões seria inviabilizada se não fosse bem enxergada uma necessidade de estabelecer critérios objetivos para solucionar eventual conflito. Desse modo, vê-se que todo direito fundamental possui um âmbito de proteção (um campo de incidência normativa ou suporte fático, como preferem outros) e, ao menos em princípio, está sujeito a intervenções neste âmbito de proteção[3].
Na importante lição de Ingo Sarlet[4]:
O âmbito de proteção de um direito fundamental abrange os diferentes pressupostos fáticos instituídos pela respectiva norma jurídica. Trata-se, com outras palavras, do bem jurídico protegido, ou seja, do objeto tutelado, que nem sempre se afigura de fácil identificação, especialmente em decorrência das indeterminações semânticas invariavelmente presentes nos textos que contemplam direitos fundamentais. Por outro lado, considerando que nenhuma ordem jurídica pode proteger os direitos fundamentais de maneira ilimitada, a ideia de que os direitos fundamentais não são absolutos não tem oferecido maiores dificuldades e tem sido amplamente aceita no direito constitucional contemporâneo. Posto de outro modo, direitos fundamentais são – de regra – direitos submetidos a limites e suscetíveis de serem restringidos.
Nesse cenário tomam destaque as duas principais teorias limitadoras dos direitos fundamentais: a teoria interna e teoria externa. Contudo, como será visto a seguir, não há consenso jurisprudencial, principalmente por parte do Supremo Tribunal Federal, acerca de sua aplicação. A partir disso, indaga-se: é possível atingir esse consenso?
2. TEORIAS LIMITADORAS DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS E SUA APLICAÇÃO PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
A denominada “teoria interna” propaga que os direitos fundamentais já possuem um conteúdo pré-definido, interno, o qual jamais poderá ser atingido. Para compreender o âmbito de proteção de determinado direito, deve-se visualizar apenas o seu conteúdo. Assim, os direitos fundamentais não podem ser limitados por outros, não se admitindo restrições externas e estranhas a sua própria estrutura. Em verdade, todas as possibilidades de delimitação estariam expressamente presentes no texto constitucional.
Dessa forma, visualizado conflito entre o conteúdo de normas distintas, deve-se solucionar a questão dentro da Constituição, a qual revela os limites imanentes – restrições ou impedimentos lógicos – dos direitos. É por isso que os adeptos dessa teoria não visualizam possibilidade de conflito entre direitos fundamentais, os quais se manifestam uma só vez, com seu conteúdo e limitações imanentes[5].
Por outro lado, na “teoria externa”, ao contrário da interna, que pressupõe a existência de apenas um objeto, há dois: em primeiro lugar, o direito em si e, destacadas dele, as suas restrições[6]. Essa construção propõe uma distinção entre uma situação prima facie e definitiva, essa configurada quando o direito já está delimitado.[7] Bem lembra Virgilio Afonso da Silva que “somente a partir do paradigma da teoria externa, segundo o qual as restrições, qualquer que seja a sua natureza, não têm nenhuma influência no conteúdo do direito, podendo apenas, no caso concreto, restringir o seu exercício, que se pode sustentar que, em uma colisão entre princípios, o princípio que tem que ceder em favor de outro não tem afetada a sua validade e, sobretudo, a sua extensão prima facie”[8].
Por consequência, a teoria externa assume a possibilidade de colisão entre direitos fundamentais, os quais serão ou não limitados por aspectos externos ao seu conteúdo próprio. Segundo seus defensores, não se pode cogitar de um modelo que sustente a existência de normas de eficácia plena e irrestringíveis, uma vez que a transição do direito prima facie para o definitivo é a expressão desse processo de restrição/regulamentação[9].
Embora possuam posições contrapostas, ambas as teorias são aplicadas de forma dispersa pela jurisprudência nacional, sobretudo o Supremo Tribunal Federal. Exemplifica-se, em primeiro lugar, a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.510, in verbis:
(...) III - A PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL DO DIREITO À VIDA E OS DIREITOS INFRACONSTITUCIONAIS DO EMBRIÃO PRÉ-IMPLANTO. O Magno Texto Federal não dispõe sobre o início da vida humana ou o preciso instante em que ela começa. Não faz de todo e qualquer estádio da vida humana um autonomizado bem jurídico, mas da vida que já é própria de uma concreta pessoa, porque nativiva (teoria "natalista", em contraposição às teorias "concepcionista" ou da "personalidade condicional"). E quando se reporta a "direitos da pessoa humana" e até dos "direitos e garantias individuais" como cláusula pétrea está falando de direitos e garantias do indivíduo-pessoa, que se faz destinatário dos direitos fundamentais "à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade", entre outros direitos e garantias igualmente distinguidos com o timbre da fundamentalidade (como direito à saúde e ao planejamento familiar). Mutismo constitucional hermeneuticamente significante de transpasse de poder normativo para a legislação ordinária. A potencialidade de algo para se tornar pessoa humana já é meritória o bastante para acobertá-la, infraconstitucionalmente, contra tentativas levianas ou frívolas de obstar sua natural continuidade fisiológica. Mas as três realidades não se confundem: o embrião é o embrião, o feto é o feto e a pessoa humana é a pessoa humana. Donde não existir pessoa humana embrionária, mas embrião de pessoa humana. O embrião referido na Lei de Biossegurança ("in vitro" apenas) não é uma vida a caminho de outra vida virginalmente nova, porquanto lhe faltam possibilidades de ganhar as primeiras terminações nervosas, sem as quais o ser humano não tem factibilidade como projeto de vida autônoma e irrepetível. O Direito infraconstitucional protege por modo variado cada etapa do desenvolvimento biológico do ser humano. Os momentos da vida humana anteriores ao nascimento devem ser objeto de proteção pelo direito comum. O embrião pré-implanto é um bem a ser protegido, mas não uma pessoa no sentido biográfico a que se refere a Constituição. (...)
(STF, ADI 3.510, Plenário, Rel. Min. Ayres Britto, DJE 28.05.2010 – grifos nossos)
Nota-se que, ao excluir da abrangência do “direito à vida” aqueles a nascer, a Corte Suprema nada mais fez do que delimitar o conteúdo interno de tal prerrogativa, a excluir hipóteses fáticas que ultrapassem o seu limite. Veja, ainda, o Habeas Corpus nº 70.814, no qual entendeu o STF que a inviolabilidade da correspondência não compreende o envio de cartas com propósitos criminosos:
HABEAS CORPUS - ESTRUTURA FORMAL DA SENTENÇA E DO ACÓRDÃO - OBSERVANCIA - ALEGAÇÃO DE INTERCEPTAÇÃO CRIMINOSA DE CARTA MISSIVA REMETIDA POR SENTENCIADO - UTILIZAÇÃO DE COPIAS XEROGRAFICAS NÃO AUTENTICADAS - PRETENDIDA ANALISE DA PROVA - PEDIDO INDEFERIDO. - A estrutura formal da sentença deriva da fiel observância das regras inscritas no art. 381 do Código de Processo Penal. O ato sentencial que contem a exposição sucinta da acusação e da defesa e que indica os motivos em que se funda a decisão satisfaz, plenamente, as exigências impostas pela lei. - A eficácia probante das copias xerográficas resulta, em princípio, de sua formal autenticação por agente público competente (CPP, art. 232, paragrafo único). Pecas reprográficas não autenticadas, desde que possível a aferição de sua legitimidade por outro meio idôneo, podem ser validamente utilizadas em juízo penal. - A administração penitenciaria, com fundamento em razoes de segurança pública, de disciplina prisional ou de preservação da ordem jurídica, pode, sempre excepcionalmente, e desde que respeitada a norma inscrita no art. 41, paragrafo único, da Lei n. 7.210/84, proceder a interceptação da correspondência remetida pelos sentenciados, eis que a cláusula tutelar da inviolabilidade do sigilo epistolar não pode constituir instrumento de salvaguarda de praticas ilicitas. - O reexame da prova produzida no processo penal condenatório não tem lugar na ação sumaríssima de habeas corpus.
(STF, HC 70814, Rel. Min. Celso De Mello, Primeira Turma, DJE 24.06.1994)
Por outro lado, em grande escala são os julgados do STF que manifestam adesão a teoria externa. Ilustra-se, neste caso, com o Recurso Ordinário em Habeas Corpus nº 146.303:
Recurso ordinário em habeas corpus. Denúncia. Princípio da correlação. Observância. Trancamento da ação penal. Descabimento. Liberdade de manifestação religiosa. Limites excedidos. Recurso ordinário não provido. 1. Inexiste violação do princípio da correlação quando há relação entre os fatos imputados na denúncia e os motivos que levaram ao provimento do pedido da condenação. 2. O direito à liberdade religiosa é, em grande medida, o direito à existência de uma multiplicidade de crenças/descrenças religiosas, que se vinculam e se harmonizam – para a sobrevivência de toda a multiplicidade de fés protegida constitucionalmente – na chamada tolerância religiosa. 3. Há que se distinguir entre o discurso religioso (que é centrado na própria crença e nas razões da crença) e o discurso sobre a crença alheia, especialmente quando se faça com intuito de atingi-la, rebaixá-la ou desmerecê-la (ou a seus seguidores). Um é tipicamente a representação do direito à liberdade de crença religiosa; outro, em sentido diametralmente oposto, é o ataque ao mesmo direito. 4. Como apontado pelo Superior Tribunal de Justiça no julgado recorrido, a conduta do paciente não consiste apenas na “defesa da própria religião, culto, crença ou ideologia, mas, sim, de um ataque ao culto alheio, que põe em risco a liberdade religiosa daqueles que professam fé diferente [d]a do paciente”. 5. Recurso ordinário não provido.
(STF, RHC 146303, Rel. Min. Edson Fachin, Relator(a) p/ Acórdão: Dias Toffoli, 2ª Turma, DJE 07.08.2018 – grifos nossos)
Nessa hipótese, o Supremo bem por entendeu que a liberdade de discurso religioso encontra limites no respeito à religião alheia. Há verdadeira limitação externa ao exercício da religião, com evidente adesão à teoria externa.
Resta-nos analisar, pois, as justificativas para a adesão conjunta das teorias por parte do STF e propor eventual solução para esse problema.
3. A BUSCA PELO CONSENSO ENTRE AMBAS AS TEORIAS
A doutrina justifica a aplicação jurisprudencial dispersa das teorias interna e externa com base na própria natureza dos direitos fundamentais, eis que “o âmbito de proteção de um direito não resulta apenas da tipificação de dados pré-normativos, mas guarda relação com determinadas finalidades constitucionalmente ancoradas e vinculadas a determinados valores, evidenciando a complexidade do processo da identificação e mesmo reconstrução do âmbito de proteção dos direitos fundamentais, visto que, mesmo quando se trata do “perfil prima facie do direito fundamental”, que ainda não leva em conta as restrições legítimas, há um perfil normativamente pré-determinado a ser respeitado”[10].
O Supremo Tribunal Federal, nessa mesma linha doutrinária, parece aceitar, ao invés de uma contraposição entre as teorias, a sua comunicação. Ao mesmo tempo, os direitos fundamentais possuem conteúdo pré-determinado e podem ser limitados por outros direitos de igual valia. É possível visualizar a tese de que o direito à vida, por exemplo, pode abranger apenas seres humanos nascidos e ser limitado, em determinados casos, pelo direito à evolução científica. Pode-se também compreender que a liberdade religiosa é restringida pelo respeito às outras regiões e, simultaneamente, não compreende o discurso odioso.
Nesse diapasão, verifica-se que os resultados práticos de ambas as teorias são os mesmos, alterando-se apenas o ônus argumentativo imposto ao julgador. É neste último ponto que defendemos a aplicação da teoria externa como mecanismo de consenso entre a tão dispersa aplicação pelos Tribunais. Isso porque nela, em um primeiro momento, já há a delimitação do direito prima facie. A visualização de um conflito posterior entre direitos fundamentais, por meio de critérios objetivos, como o princípio da proporcionalidade, aumenta o ônus argumentativo do julgador, aproximando-se do julgamento efetivo, transparente e fundamentado que tanto se preza.
A definição simplista do conteúdo do Direito pode, muitas vezes, apresentar-se arbitrária, principalmente diante de uma sociedade plural como a brasileira, da qual pode se extrair diversas concepções acerca do conteúdo de um direito. Essa acepção também parece ser defendida por Ingo Salert:
Percebe-se, desde logo, que tal distinção entre âmbito de proteção e limites oferece significativas vantagens em termos de operacionalidade jurídico-dogmática, correspondendo à exigência de transparência metodológica, especialmente por não misturar interesses divergentes, além de implicar que o ônus da justificação de uma restrição recaia sobre o intérprete que a invoca, o que apenas reforça a tese de que os fins não podem jamais justificar os meios, visto que não apenas o resultado, mas, sobretudo, o caminho percorrido da conversão de uma posição prima facie (âmbito de proteção) em um direito (ou garantia) definitivo afigura-se decisivo e viabiliza um controle de todo o procedimento[11].
Por meio da teoria externa, permite-se verificar, através da aplicação do princípio da proporcionalidade, a adequação (aptidão para atingir o fim pretendido), necessidade (inexistência de meio menos oneroso) e proporcionalidade em sentido estrito (ponderação do caso concreto) da restrição a determinado direito fundamental. A acepção de um ônus argumentativo acentuado, em detrimento de uma análise impositiva acerca do conteúdo interno do direito, parece mais consentâneo com o Estado Democrático de Direito. Afinal, a fundamentação das decisões judiciais se apresenta como pressuposto de legitimidade da própria função jurisdicional, exercida por representantes não eleitos.
Ademais, a aplicação indiscriminada da teoria interna poderia conduzir exacerbada intervenção do Estado sobre as relações individuais, ocasionando, consequentemente, um déficit em suas garantias[12]. Esse perigo somente será afastado com a utilização de um instrumento metodológico transparente e persuasivo.
Nesse sentido, o ponto de consenso ideal seria o abandono da teoria interna, para se assumir a completa adesão à teoria externa, por se apresentar em consonância com a proteção dos direitos fundamentais da dignidade, transparência e isonomia.
4. CONCLUSÃO
Por todo o exposto, verificou-se que as teorias interna e externa possuem concepções distintas acerca da limitação dos direitos fundamentais. Na primeira, eventual restrição se encontra em seu próprio conteúdo. Na última, a análise é bipartida: primeiro, há definição de seu alcance interno para, depois, visualizar o externo.
A prática jurisprudencial, contudo, demonstra que o resultado prático das duas é o mesmo. Isso porque é perfeitamente possível pré-determinar o conteúdo de um direito e assumir sua limitação em face de outros. Essa parece ter sido a acepção adotada pelo Supremo Tribunal Federal, eis que a sua jurisprudência é dispersa com relação à aplicação de ambas as teorias.
Deve-se visualizar, porém, que é possível encontrar um ponto de consenso, e aqui defendemos o abandono da teoria interna para se assumir a integral adesão à externa. Isso porque, esta última, além de obter o mesmo resultado prático, oferece o ônus argumentativo necessário para o magistrado justificar eventual restrição ao direito fundamental em lide. Há, nesse caso, a verdadeira representação do Estado Democrático de Direito.
5.REFERÊNCIAS BIBIOGRÁFICAS
CORREIA, José Manuel Sérvulo. O direito de manifestação: âmbito de protecção e restrições. Coimbra: Almedina, 2006.
SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI; Luiz Guilherme; MITIDIERO Daniel. Curso de direito constitucional. 8. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019.
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo Imprenta: Salvador, JusPODIVM, São Paulo, Malheiros, 2020.
D19 16- RESTRIÇÕES E CONFRONTOS AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS: uma proposta de análise discursiva. Cândice Lisbôa Alves. Revista Eletrônica de Direito do Centro Universitário Newton Paiva. Número 19. Disponível em: < https://revistas.newtonpaiva.br/redcunp/d19-16-restricoes-e-confrontos-aos-direitos-fundamentais-uma-proposta-de-analise-discursiva/>.
KIM. Richard PAE. Separação de poderes e as teorias interna e externa dos direitos fundamentais: direitos sociais e a inaplicabilidade da teoria externa. Cadernos Jurídicos, São Paulo, ano 16, nº 40, p. 165-187, Abril-Junho/2015.
SILVA, Virgílio Afonso da. O conteúdo essencial dos direitos fundamentais e a eficácia das normas constitucionais. Revista de Direito do Estado 4 (2006): 23-51. Disponível em: < https://constituicao.direito.usp.br/wp-content/uploads/2006-RDE4-Conteudo_essencial.pdf>
Referências numéricas:
[1]Curso de direito constitucional positivo / José Afonso da Silva. Imprenta: Salvador, JusPODIVM, São Paulo, Malheiros, 2020. p. 163.
[2] Curso de direito constitucional / Ingo Wolfgang Sarlet, Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero. – 8. ed. – São Paulo : Saraiva Educação, 2019. P. 411
[3] Curso de direito constitucional / Ingo Wolfgang Sarlet, Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero. – 8. ed. – São Paulo : Saraiva Educação, 2019. P. 486
[4] Curso de direito constitucional / Ingo Wolfgang Sarlet, Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero. – 8. ed. – São Paulo : Saraiva Educação, 2019. P. 487
[5]. D19 16- RESTRIÇÕES E CONFRONTOS AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS: uma proposta de análise discursiva. Cândice Lisbôa Alves. Revista Eletrônica de Direito do Centro Universitário Newton Paiva. Número 19. Disponível em: < https://revistas.newtonpaiva.br/redcunp/d19-16-restricoes-e-confrontos-aos-direitos-fundamentais-uma-proposta-de-analise-discursiva/>
[6] SILVA, Virgílio Afonso da. O conteúdo essencial dos direitos fundamentais e a eficácia das normas constitucionais, Revista de Direito do Estado 4 (2006): 23-51. Disponível em: < https://constituicao.direito.usp.br/wp-content/uploads/2006-RDE4-Conteudo_essencial.pdf>
[7] Curso de direito constitucional / Ingo Wolfgang Sarlet, Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero. – 8. ed. – São Paulo : Saraiva Educação, 2019. P. 488
[8] SILVA, Virgílio Afonso da. O conteúdo essencial dos direitos fundamentais e a eficácia das normas constitucionais, Revista de Direito do Estado 4 (2006): 23-51. Disponível em: < https://constituicao.direito.usp.br/wp-content/uploads/2006-RDE4-Conteudo_essencial.pdf>
[9] SILVA, Virgílio Afonso da. O conteúdo essencial dos direitos fundamentais e a eficácia das normas constitucionais, Revista de Direito do Estado 4 (2006): 23-51. Disponível em: < https://constituicao.direito.usp.br/wp-content/uploads/2006-RDE4-Conteudo_essencial.pdf>
[10] CORREIA, José Manuel Sérvulo O direito de manifestação : âmbito de protecção e restrições / Sérvulo Correia.- Coimbra : Almedina, 2006. P. 31-34.
[11] Curso de direito constitucional / Ingo Wolfgang Sarlet, Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero. – 8. ed. – São Paulo : Saraiva Educação, 2019. P. 490.
[12] KIM. Richard PAE. Separação de poderes e as teorias interna e externa dos direitos fundamentais: direitos sociais e a inaplicabilidade da teoria externa. Cadernos Jurídicos, São Paulo, ano 16, nº 40, p. 165-187, Abril-Junho/2015.
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