THE EDUCATION ACCORDING TO THE PHILOSOPHER JEAN-JACQUES ROUSSEAU'S PERSPECTIVE
Informações Básicas
Revista Qualyacademics v.2, n.3
ISSN: 2965-9760
Tipo de Licença: Creative Commons, com atribuição e direitos não comerciais (BY, NC).
Recebido em: 28/06/2024
Aceito em: 29/06/2024
Revisado em: 02/07/2024
Processado em: 03/07/2024
Publicado em 06/07/2024
Categoria: Artigo de revisão
Como referenciar esse artigo Silva (2024):
SILVA, Silvia Ferreira Mendes da. A educação segundo o ponto de vista do filósofo Jean Jacques Rousseau. Revista QUALYACADEMICS. Editora UNISV; v. 2, n. 3, 2024; p. 416-427. ISSN: 2965-9760 | DOI: doi.org/10.59283/unisv.v2n3.028
Autora:
Silvia Ferreira Mendes da Silva
Graduada em Pedagogia Universidade Sagrado Coração (USC) e História - UNIFATECIE. Pós-graduada em Gestão Escola - FAEL; Didática e Metodologia do Ensino Superior - UNIFATECIE; e em Educação em Direitos Humanos - FAVENI. Contato: silviafms57@gmail.com
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RESUMO
Este artigo tem como objetivo analisar a visão educacional de Jean Jacques Rousseau, explorando suas ideias centrais e influências, destacando sua contribuição para a filosofia e pedagogia. Jean Jacques Rousseau, um filósofo do Iluminismo e precursor do romantismo, é conhecido por sua crença na bondade natural do homem e sua crítica à sociedade por corromper essa bondade. Suas obras, particularmente "O Contrato Social" e "Emílio, ou Da Educação", continuam a influenciar práticas pedagógicas modernas que valorizam o desenvolvimento integral e respeitam as peculiaridades de cada fase da infância. Rousseau propôs uma educação natural, livre das imposições sociais, que respeitasse cada fase da vida da criança, defendendo que a educação deve preparar o indivíduo para viver em liberdade. Apesar de suas ideias terem sido formuladas no século XVIII, elas permanecem avançadas e relevantes até os dias atuais. A filosofia de Rousseau é marcada por um otimismo em relação à natureza humana e uma busca pela libertação do homem das injustiças e opressões sociais. Sua visão pedagógica e política, fundamentada na bondade natural do homem, levou-o a criticar a sociedade contemporânea e a propor um sistema educativo que promove a liberdade e a igualdade. Além de influenciar práticas pedagógicas modernas, suas ideias também inspiraram movimentos revolucionários e regimes subsequentes na Europa continental, demonstrando a ampla e duradoura influência de seu pensamento.
Palavras-chave: Jean Jacques Rousseau; Educação natural; Pedagogia.
ABSTRACT
This article aims to analyze Jean Jacques Rousseau's educational vision, exploring his central ideas and influences, highlighting his contributions to philosophy and pedagogy. Jean Jacques Rousseau, a philosopher of the Enlightenment and a precursor of Romanticism, is known for his belief in the natural goodness of man and his critique of society for corrupting that goodness. His works, particularly "The Social Contract" and "Emile, or On Education," continue to influence modern pedagogical practices that value holistic development and respect the peculiarities of each stage of childhood. Rousseau proposed a natural education, free from social impositions, that respects each stage of a child's life, advocating that education should prepare the individual to live in freedom. Despite his ideas being formulated in the 18th century, they remain advanced and relevant to this day. Rousseau's philosophy is marked by an optimism about human nature and a quest for liberating man from social injustices and oppressions. His pedagogical and political vision, grounded in the natural goodness of man, led him to critique contemporary society and propose an educational system that promotes freedom and equality. In addition to influencing modern pedagogical practices, his ideas also inspired revolutionary movements and subsequent regimes throughout continental Europe, demonstrating the broad and lasting influence of his thought.
Keywords: Jean Jacques Rousseau; Natural Education; Pedagogy.
1. INTRODUÇÃO
Nas páginas que se seguem, abordaremos a educação segundo o ponto de vista do filósofo Jean Jacques Rousseau (28 de junho de 1712, Genebra - 2 de julho de 1778, Ermenonville, perto de Paris). Ele foi um filósofo suíço, escritor, teórico político e compositor musical autodidata, além de influenciar outros autores com suas obras. Apesar de Rousseau ter vivido no século XVIII, suas ideias continuam sendo consideradas avançadas nos dias atuais.
O autor é polêmico, considerado um gênio por alguns e louco por outros. Voltaire afirmou que "ninguém colocou alguma vez tanto engenho em nos querer converter em animais" quanto ele. Ler Rousseau faz nascer "o desejo de caminhar em quatro patas". Entretanto, outras interpretações, como a do antropólogo Roger Bartra, nos dizem que este comentário irônico de Voltaire não é uma boa interpretação da obra de Rousseau, já que, para Bartra, "Rousseau não oferecia o homem selvagem como um tipo humano ideal, como insinua Voltaire, mas um modelo que permite compreender a origem do mal" (BARTRA, 1997, 180-1). A função principal de sua filosofia é libertar o homem.
Uma das figuras marcantes do Iluminismo francês, Rousseau é também um precursor do romantismo. Rousseau foi uma das principais inspirações ideológicas da segunda fase da Revolução Francesa - a última das revoluções modernas - que deu início a um longo período de terror e instabilidade política, culminando na ditadura de Napoleão. "O Contrato Social", de sua autoria, inspirou muitos dos revolucionários e regimes nacionalistas e opressivos subsequentes a esse período, um pouco por toda a Europa continental. O filósofo encontra-se entre aqueles autores que mitificaram um passado fraternal e feliz de todos os Homens, em contraste com um presente desordenado e desigual do século XVIII.
Sua filosofia, partidária de uma educação natural, sempre esteve vinculada a uma concepção otimista do homem e da natureza. A coerência com suas ideias de liberdade e igualdade o levou a colocar seus filhos em uma instituição de assistência pública da época. Seu pensamento político, baseado na ideia da bondade natural do homem, levou-o a criticar em diversas ocasiões a desnaturalização, a injustiça e a opressão da sociedade contemporânea.
"O Contrato Social" (1762) e "Emílio, ou Da Educação" (1762) são, entre suas obras, as de maior conteúdo pedagógico. Por meio delas, postula um sistema político, educativo, moral e religioso extremamente controvertido. Rousseau, filósofo da natureza, da liberdade e igualdade, com suas obras, ainda inquieta a humanidade.
2. DESENVOLVIMENTO
2.1. A VIDA DE ROUSSEAU
Tão importante quanto a descrição proposta do Emílio de Rousseau é o conhecimento de sua vida, para que se possa demarcar sua posterioridade nas áreas de política, filosofia, psicologia infantil, literatura, sociologia, entre outras. Jean Jacques Rousseau foi um dos mais considerados pensadores europeus no século XVIII. Sua obra inspirou reformas políticas e educacionais. Nasceu em Genebra, na Suíça, em 28 de junho de 1712, e faleceu em Ermenonville, nordeste de Paris, França, em 2 de julho de 1778. Foi filho de Isaac Rousseau, relojoeiro de profissão, com antepassados protestantes e, apesar da profissão, nunca chegou a pertencer à aristocracia. Era um pouco mais pobre do que os demais irmãos, em virtude de ter que dividir a herança com mais quatorze irmãos. Casou-se com Suzanne Bernard, filha de um pastor de Genebra. A mãe de Rousseau veio a falecer poucos dias após seu nascimento. Rousseau tinha um irmão mais velho, François, sete anos mais velho, que abandonou a família ainda jovem (NASCIMENTO, 1995).
Rousseau foi criado na infância por uma irmã de seu pai e uma ama. Em certo momento, perdeu também o pai, que, no ano de 1722, desentendeu-se com um cidadão de certa influência, ferindo-o no rosto em um encontro na rua. Este incidente obrigou seu pai a deixar Genebra para não ser injustamente preso (STAROBINSKI, 1991).
Segundo o mesmo autor, junto com seu irmão, Rousseau ficou com o tio Gabriel Bernard, engenheiro militar que era irmão de sua mãe e casado com uma irmã de seu pai. Ainda de acordo com Starobinski, Rousseau não teve educação regular, senão por certos períodos, e não frequentou nenhuma universidade. Era um autodidata. Ainda na casa paterna, leu muito; lia para seu pai, enquanto este trabalhava em casa nos misteres de relojoeiro, os livros deixados por sua mãe e pelo pastor, seu avô materno. Juntamente a essas leituras, Rousseau acrescentará muitas outras, especialmente livros de história.
Sob tutela de seu tio, foi enviado para Bossey, a fim de estudar com o pastor Lambercier. Aos 12 anos, de volta a Genebra, passou alguns anos na casa de um tio (outro), aprendendo a desenhar com um primo. Nessa época, pensou até em ser ministro evangélico por admirar a atividade, mas os recursos econômicos de que dispunha não eram suficientes para continuar os seus estudos nesse sentido. Assim, o sentimento de inferioridade social começa a ser alternante no caráter de Rousseau. Aos 14 anos, será aprendiz na casa de um gravador e, aos 16 anos de idade, foge da cidade para escapar aos maus-tratos do patrão. De 1728 a 1742, vagueia e trabalha pelo sul da França, pelo norte da Itália, pela Suíça, lendo muito, ensinando música, vivendo de vários empregos, ao sabor das circunstâncias e de seus amores (CERISARA, 1990).
Segundo o mesmo autor, em meio a muitas humilhações e angústias pelas quais passou, Rousseau teve melhor sorte ao fazer amizade com o filósofo Condillac (1715-1780) e com Denis Diderot (1713-1784), que lhe encomendou artigos sobre música para a enciclopédia. Ainda de acordo com Cerisara, em 1745, liga-se a Thérèse Levasseur, com quem tem cinco filhos, ambos direcionados a orfanatos, porque Rousseau achava que não poderia cuidar deles sendo pobre e doente. Presencia-se em Rousseau a marca do remorso presente no resto de sua vida, e, para livrar-se dele, preocupava-se sempre em encontrar justificativas.
Em 1746, com a morte de seu pai, Rousseau recebeu uma pequena herança e pôde sobreviver folgadamente. O momento em que Rousseau decide concorrer em um concurso é extremamente importante para seu futuro desenvolvimento. Este momento fica claro em Rousseau (1983, p.82):
Em 1749, ao visitar Diderot na prisão (estava preso devido à sua obra Lettre Sur lês aveugles), Rousseau leu o anúncio de um concurso da Academia de Dijon e sentiu grande emoção ante a perspectiva de concorrer com êxito. A questão era se a restauração das ciências e das artes tinha tendido a purificar a moral. Estimulado pelo amigo, enviou um trabalho. Seu ensaio, conhecido sob o título abreviado de Discurso sobre as ciências e as artes, ganhou o primeiro prêmio e sua publicação ao final do ano seguinte o tornou famoso.
No Discurso sobre as ciências e as artes (1750), Rousseau articulou o tema fundamental que corre através de sua filosofia social: o conflito entre as sociedades modernas e a natureza humana e ressalta o paradoxo da superioridade do estado selvagem, proclamando a "volta da natureza". Ao mesmo tempo, denuncia as artes e as ciências como corruptoras do homem (ROUSSEAU, 1983). Ainda de acordo com o mesmo autor, nessa ocasião, Rousseau caiu doente e desenganado por médicos e pensa em reformular sua vida, adaptando-se à doença e afastando-se da agitação da vida social.
A Academia de Dijon propôs novo trabalho, desta vez sobre a origem da desigualdade entre os homens. Para escrevê-lo, passeando nos bosques em Saint Germain, procurou recriar na mente a imagem do homem natural. Desenvolveu o tema de que os próprios males da civilização vinham dos que afligiam o homem civilizado. Considera os homens iguais no estado natural, quando viviam isoladamente como selvagens, e que a civilização se encarrega de introduzir a desigualdade. Embora sem êxito, sem o prêmio, é seu segundo escrito sensacional. Sua fama estava assegurada (ROUSSEAU, 1983).
O mesmo autor relata que, em 1756, Rousseau escreveu uma carta a Voltaire, dando-lhe conselhos sobre sua visão negativa do mundo. Rousseau diz que o livro "Cândido ou o otimismo" foi uma resposta sarcástica a seus pontos de vista otimistas, expressos naquela carta. Em 1756, também, põe-se a escrever o romance "A nova Heloísa", típico de sua personalidade romântica.
Rousseau, em 1762, publica um de seus mais conhecidos e influentes trabalhos: "Emílio ou da Educação" e "Do Contrato Social". Os dois livros, após sua publicação, foram considerados ofensivos à autoridade, e assim Rousseau inicia um período difícil de perseguições políticas. Seus problemas não são mais com amigos ou amantes, mas com o parlamento. Refugia-se em Neuchâtel. Voltaire, através de um panfleto, critica Rousseau, magoando-o fortemente. Assim, pôs-se a escrever "As Confissões", relatando toda a sua vida e pensamento, sendo assim uma espécie de autobiografia, sintetizando-o como homem, filósofo, educador e romântico (ROUSSEAU, 1983).
Em seus últimos anos de vida, Rousseau escreve os "Devaneios de um caminhante solitário", com descrições da natureza e dos sentimentos humanos. Falece em Ermenonville e seu corpo é encontrado na Ilha de Choupos (FORTE, 1976).
2.2. O PENSAMENTO DE ROUSSEAU
Rousseau é um filósofo iluminista e precursor do romantismo no século XIX, e, apesar de ser iluminista, era crítico ao movimento. Caracteristicamente iluminista, ele acreditava que a sociedade havia pervertido o homem natural, que vivia harmoniosamente com a natureza, livre de egoísmo, cobiça, possessividade e ciúme (NARODWSKI, 1994). Segundo o mesmo autor, Rousseau recebeu várias críticas de Voltaire, que disse: "Ninguém jamais pôs tanto engenho em querer nos converter em animais" e que "ler Rousseau faz nascer desejos de caminhar em quatro patas". No entanto, a proposta rousseaniana é combater os abusos e não repudiar os valores humanos.
Sua teoria política é, sob vários aspectos, uma síntese de Hobbes e Locke. O ferro e o trigo civilizaram o homem e arruinaram a raça humana. Ainda de acordo com Narodwski, Rousseau não busca retornar o homem à primitividade, ao estado natural, mas ele busca meios para diminuir as injustiças que resultam da desigualdade social. Indica, assim, alguns caminhos:
1. Igualdade de direitos e deveres políticos ou o respeito por uma "vontade geral".
2. Educação pública para todas as crianças, baseada na devoção pela pátria e austeridade moral.
3. Um sistema econômico e financeiro que combine os recursos da propriedade pública com taxas sobre a herança e o luxo.
2.3. A PEDAGOGIA DE ROUSSEAU
Os pressupostos básicos de Rousseau a respeito da educação eram a crença na bondade natural do homem e a atribuição à civilização da responsabilidade pela origem do mal. A educação deveria levar o homem a agir por interesses naturais e não por imposição de regras exteriores artificiais, pois só assim o homem poderia ser dono de si próprio. Outro aspecto da educação natural está em não aceitar uma educação intelectualizada, levando ao ensino formal e livresco. O homem não é constituído apenas por intelecto, pois suas disposições primitivas, tais como os sentidos, os instintos, as emoções e os sentimentos, existentes antes do pensamento elaborado, são dimensões mais dignas de confiança (FORTE, 1976).
Segundo o mesmo autor, Rousseau utilizou novas ideias para combater as que prevaleciam em sua época há muito tempo, principalmente a de que a educação da criança deveria ser voltada aos interesses do adulto e da vida adulta. Introduz a concepção de que a criança é um ser com características próprias, e, desse modo, não podia ser vista como um adulto ou a partir de seu pensamento. Com essas ideias, derrubou concepções vigentes que pregavam que a educação era o processo pelo qual a criança adquire seus conhecimentos, atitudes e hábitos armazenados pela civilização, sem transformações (FORTE, 1976).
Cada fase da vida, para Rousseau, tem suas características próprias. O homem e a sociedade modificam-se, e a educação é fundamental para a necessária adaptação a essas modificações. Rousseau afirma que a educação não vem de fora, é a expressão livre da criança no seu contato com a natureza (NASCIMENTO, 1995).
O mesmo autor coloca que, no contexto de sua época, Rousseau formulou princípios educacionais que permanecem até os nossos dias, principalmente quando afirmava que a verdadeira finalidade da educação era ensinar a criança a viver e aprender a exercer a liberdade. Pode-se afirmar que as ideias de Rousseau influenciam diferentes correntes pedagógicas, principalmente as tendências não diretivas, no século XX.
Assim, podemos enfatizar que, na verdade, Rousseau é ao mesmo tempo amado e temido: sua obra e mesmo sua pessoa são fascinantes para uma época em que um novo homem se abria para novos tempos, em que um eu solitário e muito puro se abria para o futuro e, sobretudo, para a alma romântica que estava nascendo (NASCIMENTO, 1995).
2.4. CONCEITO SOCIAL DA EDUCAÇÃO
A reforma da educação é que possibilitaria uma reforma do sistema político e social.
Criar uma sociedade fundada na família, no povo, no soberano, na pátria e no Estado.
A educação não somente mudaria as pessoas particulares, mas também toda a sociedade, pois trata-se de educar o cidadão para que ele ajude a forjar uma nova sociedade.
A "educação natural" preconizada por ele encontra-se retratada na obra "O Emílio", na qual, de forma romanceada, expõe suas concepções através dos relatos da educação de um jovem, acompanhado por um preceptor ideal e afastado da sociedade corruptora. Essa educação naturalista não significa retornar a uma vida selvagem, primitiva, isolada, mas sim afastada dos costumes da aristocracia da época, da vida artificial que girava em torno das convenções sociais. A educação deveria levar o homem a agir por interesses naturais e não por imposição de regras exteriores e artificiais, pois só assim o homem poderia ser dono de si próprio. Outro aspecto da educação natural está na não aceitação, por Rousseau, de uma educação intelectualista, que fatalmente levaria ao ensino formal e livresco. O homem não se constitui apenas de intelecto, pois disposições primitivas, nele presentes, como as emoções, os sentidos, os instintos e os sentimentos, existem antes do pensamento elaborado; estas dimensões primitivas são, para ele, mais dignas de confiança do que os hábitos de pensamento que foram forjados pela sociedade e impostos ao indivíduo (CERISARA, 1990).
2.4.1. Conceito de aluno
Concebia um modelo único de homem: marido, cidadão e patriota.
A criança é um ser inocente e bom por natureza.
Rousseau trouxe novas ideias para combater aquelas que prevaleciam há muito tempo em sua época, principalmente a de que a educação da criança deveria ser voltada aos interesses do adulto e da vida adulta. Algumas ideias características deste pensamento podem ser vistas em Cerisara (1990, p. 125) “Introduziu a concepção de que a criança era um ser com características próprias em suas ideias e interesses, e desse modo não mais podia ser vista como um adulto em miniatura.”
Com suas ideias, ele derrubou as concepções vigentes que pregavam ser a educação o processo pelo qual a criança passa a adquirir conhecimentos, atitudes e hábitos armazenados pela civilização, sem transformações. Considerava cada fase da vida como tendo características próprias. Tanto o homem quanto a sociedade se modificam, e a educação é elemento fundamental para a necessária adaptação a essas modificações. Se cada fase da vida tem suas características próprias, a educação inicial não poderia mais ser considerada uma preparação para a vida, da maneira que era concebida pelos educadores à época.
Rousseau afirmou que a educação não vem de fora, é a expressão livre da criança no seu contato com a natureza. Ao contrário da rígida disciplina e do excessivo uso da memória vigentes então, propôs que fossem trabalhadas com a criança: o brinquedo, o esporte, a agricultura e o uso de instrumentos de variados ofícios, linguagem, canto, aritmética e geometria. Através dessas atividades, a criança estaria medindo, contando, pesando; portanto, estariam sendo desenvolvidas atividades relacionadas à vida e aos seus interesses.
2.5. EDUCAÇÃO PÚBLICA, EDUCAÇÃO PRIVADA, FORMAR O HOMEM OU O CIDADÃO? QUESTÕES A PARTIR DE EMILIO DE ROUSEAU
Rousseau, a partir da questão acima, propõe rever a contradição existente entre o homem e o cidadão, pois, segundo ele, não é possível a existência de um homem e um cidadão simultaneamente, uma vez que nestas duas pessoas existem contrapontos, sendo tipos opostos e excludentes. No plano filosófico geral de Rousseau, a contradição homem/cidadão se dá através da contradição existente entre o homem e a sociedade.
Para Rousseau, o homem nasce bom e a sociedade o corrompe, ou seja, o homem, através da história, torna-se mau, com o objetivo de lesar o outro. O homem primitivo era bom porque era natural. A partir da questão da formação do homem ou do cidadão, como os homens poderiam voltar a ser bons? Rousseau propõe sua solução política através do Contrato Social, e a solução pedagógica é apresentada no Emílio.
A maldade existente entre os homens está presente no "Discurso sobre a Origem e os Fundamentos da Desigualdade entre os Homens". Nesse discurso, Rousseau divide a evolução do homem em três estágios diferentes:
1. Estado – homem natural
2. Estado – homem selvagem
3. Estado – homem civilizado
O homem natural é um animal que se integra à natureza e a mesma é generosa para com o homem (instinto e sensação), que vive isoladamente por vontade própria, independente do semelhante, mas dependente da natureza, de onde retira tudo o que precisa e é guiado pelo instinto de conservação (preocupação consigo). O homem selvagem, que remete às sociedades indígenas, já tem um interesse particular, marcas, vícios e conflitos a partir da consciência moral, de onde nasce a virtude. O homem civilizado tem seus interesses particulares fortalecidos e entram em conflito, pois sua consciência moral é abafada, existindo a oposição de interesses. Assim, o homem tornou-se egocêntrico e individualista, tornando-se um homem natural no mau sentido.
A contradição homem/cidadão no Emílio está presente num plano de princípios. Seu livro não trata de uma proposta de educação, mas sim de uma filosofia da educação com conceitos e ideias de modo abstrato do homem em geral. Emílio é um personagem fictício para ilustrar os princípios de Rousseau em seu ensaio pedagógico sob a forma de romance. Como já foi relatado no início da discussão, a preocupação de Rousseau centra-se no objetivo de optar entre formar o homem ou o cidadão, na impossibilidade de haver os dois ao mesmo tempo, já que são antagônicos e também são dois tipos puros, conceituais, existentes no plano de princípios.
Para Rousseau, o homem, dito homem natural, forma-se através da educação doméstica ou privada no seio da família. É um ser inteiro, de existência absoluta, relacionando-se consigo mesmo, e tudo é para si mesmo. Como exemplo, pode-se citar o homem natural de que Rousseau trata no "Discurso sobre a Origem e os Fundamentos da Desigualdade entre os Homens". O cidadão é formado através do projeto educacional público assistido pelo Estado. O cidadão é uma fração, existindo na relação em um todo, tendo uma existência relativa. Rousseau exemplifica o cidadão como a mãe espartana que, diante de uma guerra, é informada sobre a morte de seus filhos no decorrer da mesma, pouco importando-se com o fato, mas preocupando-se com a vitória de sua pátria, demonstrando-se uma verdadeira cidadã.
A partir destas descrições, quem seria o "homem civilizado" do presente em relação a estes dois tipos (homem e cidadão)? Na verdade, ele não seria nem um nem outro, pois a educação da sociedade não formaria nenhum deles, mas sim um ser misto. Para a conciliação destes dois seres, é necessário o conhecimento do homem natural (por exemplo, a criança, que é um), e assim, o cidadão somente poderá existir a partir deste homem natural, o qual será originado pela natureza. Para vê-lo, a história individual será o caminho.
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Após todos os fatos expostos, pode-se afirmar que Rousseau nunca se prendeu única e exclusivamente à educação, estando também ligado à política, filosofia, psicologia infantil, literatura, sociologia, entre outras áreas. Mesmo sem ter uma educação formal e nunca ter chegado à universidade, Rousseau foi considerado um dos maiores pensadores de sua época, e ainda hoje é amplamente reconhecido.
Muito criticado por sempre defender que os homens nascem bons e que é o meio que os modifica, Rousseau foi taxado por muitos como louco, amado por uns e odiado por outros. Apesar das fortes críticas recebidas por suas ideias, hoje vemos que Rousseau estava certo em muitos aspectos. Não se pode educar a criança apenas para satisfazer os interesses dos adultos; é preciso respeitar cada fase da educação, bem como a idade da criança, para que possamos formar cidadãos plenos.
É impressionante como as ideias de Rousseau, que morreu há mais de 200 anos, ainda se alinham com as práticas educativas contemporâneas. Juntamente com as ideias de outros pedagogos influenciados por Rousseau, estamos tentando mudar a educação para atender às necessidades dos alunos, respeitando suas idades e estágios de desenvolvimento. Assim, em um futuro não muito distante, esperamos formar cidadãos preparados e conscientes, capazes de contribuir para uma sociedade mais justa.
Rousseau acreditava que todos nós nascemos bons e somos corrompidos pelo modelo atual de sociedade. Sua visão continua a desafiar e inspirar educadores a buscar formas de promover uma educação que respeite a natureza intrínseca do ser humano e que prepare indivíduos para viverem em liberdade e harmonia com a natureza e com a sociedade. Suas ideias permanecem relevantes e fundamentais para a construção de um sistema educacional que valorize o desenvolvimento integral do ser humano e que busque, acima de tudo, formar cidadãos comprometidos com a justiça e a igualdade.
4. REFERÊNCIAS
CERISARA, Ana Beatriz. Rousseau: a educação na infância. São Paulo: Scipione, 1990.
Ed. Ática, 1976.
FORTE, Luís Roberto Salinas. Rousseau: da teoria à prática. São Paulo.
NARODWSKI, Mariano. Infância y poder: la conformación dela pedagogia moderna. Buenos Aires: Aique, 1994.
NASCIMENTO, Mª Evelyna do. A pedagogia Freinet: natureza, educação e sociedade. Campinas, Unicamp, 1995.
ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do Contrato Social. Ensaio sobre a origem das línguas. Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens. Discurso sobre as ciências e as artes. Tradução de Lourdes Santos Machado. 3.º Ed. São Paulo. Abril Cultural (Os Pensadores), 1983.
STAROBINSKI, Jean. Jean-Jacques Rousseau: a transparência e o obstáculo. Tradução: Maria Lúcia Machado. São Paulo. Cia. Das Letras,1991.
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Esse artigo pode ser utilizado parcialmente em livros ou trabalhos acadêmicos, desde que citado a fonte e autor(es). Creative Commons, com atribuição e direitos não comerciais (BY, NC).
Como citar esse artigo:
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